TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015

272 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL responsabilidade limitada nos termos da lei comercial, nas quais o Estado ou outras entidades públicas pos- sam exercer, isolada ou conjuntamente, de forma direta ou indireta, influência dominante». Tratando-se de uma entidade pública empresarial, por revestir a forma de pessoa coletiva pública, não há quaisquer dúvidas que se integra no conceito de Administração Pública, para efeitos do âmbito de incidência do direito de acesso aos documentos administrativos. Mas quanto às empresas públicas sob a forma societária colocam-se dúvidas na delimitação do universo das empresas obrigadas genericamente ao acesso, porque o conceito legal de empresa pública é muito mais amplo do que a delimitação que o n.º 2 do artigo 82.º das CRP faz do setor público empresarial. De facto, para integrar o setor público, o preceito constitucional exige a natureza pública tanto da propriedade como da gestão da empresa. Ora, os critérios que o legislador usou para definir influência dominante não obedecem necessariamente aos critérios de delimitação do setor público empresarial. Nos termos do artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 133/2013, a influência dominante concretiza-se através de alguns fatores que dispensam a propriedade jurídica da empresa, nomeadamente, a maioria dos direitos de voto, a possibilidade de designar ou destituir a maioria dos membros do órgão de administração ou do órgão de fiscalização, e a posse de participações qualificadas ou direitos especiais. Isto significa que o conceito legal de empresa pública, que teve a influência do direito comunitário, abrange também empresas nas quais o setor público não tem participação maioritária no capital social. Ou seja, as empresas públicas de capitais maio- ritariamente privados não integram o setor público empresarial, embora sejam entidades particulares que o legislador, dentro da sua liberdade de conformação, entendeu incluir na noção de empresa pública (cfr. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo II, p. 37). Já as empresas de capitais exclusivamente ou maioritariamente públicos, quando revestem formato pri- vado, qualificam-se como entidades administrativas privadas. A relação específica que mantêm com as enti- dades públicas que as criaram é uma relação de domínio ou de influência dominante, o que as coloca na esfera do Estado e da Administração Pública. Perante a ausência de um conceito unitário de Administração Pública, grande parte da doutrina integra, do ponto de vista institucional, as empresas públicas sob forma societária no conceito de Administração Pública em sentido orgânico, usando os conceitos de “Adminis- tração indireta privada” ou de “Administração Pública em forma privada” (cfr. Pedro Gonçalves, Entidades Privadas com Poderes Públicos, pp. 283, 397 e 433 e “Entidades Privadas com poderes administrativos”, in Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 58, p. 52; Paulo Otero, Legalidade e Administração Pública, p. 305, e Vinculação e Liberdade de Conformação Jurídica do Setor Empresarial do Estado, p. 228 e Miguel Assis Rai- mundo, As Empresas Públicas nos Tribunais Administrativos, Almedina, pp. 61 e segs.). Paulo Otero considera mesmo que «há uma equivalência estrutural e funcional entre estas entidades privadas e os institutos públicos integrantes da Administração indireta», uma vez que estão vinculadas à prossecução do interesse público, enquanto expressão instrumental de interesses integrantes dos fins ou atribuições da entidade pública que participa no respetivo capital; e Pedro Gonçalves fala numa “integração institucional” das empresas públicas na Administração Pública em sentido estrito, pretendendo esclarecer que «um tal efeito surge (exclusivamente) determinado pela situação subjetiva da entidade privada, em con- creto, pelo facto de se tratar de uma entidade privada sob domínio público». Independentemente da conceção que se tenha sobre a integração das empresas públicas na teoria da organização administrativa, o que não oferece dúvida é que as empresas que fazem parte do setor público empresarial, tal como definido no n.º 2 do artigo 82.º da CRP, embora possam ver a sua atuação regulada pelo direito privado, desenvolvem uma atividade pública, caracterizada por fins de natureza pública. A cir- cunstância de atuarem em ambiente de concorrência e de mercado, como qualquer outro operador econó- mico, não permite esquecer que a sua existência e o seu agir radica nas entidades públicas que as criaram. Subjacente à criação (ou conversão) de uma empresa pública estão sempre interesses e finalidades públicas que integram os fins ou atribuições da entidade instituidora. As empresas do setor público empresarial não deixam de ser públicas no exercício da sua atividade, mesmo quando usam formas ou instrumentos de

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