TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
268 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 13 . Apesar de ser necessária uma intervenção legislativa que regulamente e concretize estes direitos – o que ocorreu com o Código do Procedimento Administrativo (CPA), para o direito à informação procedi- mental, e com a LADA, para o acesso aos arquivos e registos administrativos – o preceito constitucional que os consagra delimitou-lhes o respetivo âmbito com densidade normativa suficiente para serem diretamente aplicáveis. Dentro das várias implicações que o direito de acesso aos registos e arquivos administrativos pode ter no caso concreto, em que se discute o acesso à informação detida por empresas públicas, assume particular importância conhecer quem são os sujeitos abrangidos pelo dever de informação. Como se trata de um direito fundamental diretamente aplicável, os sujeitos passivos do acesso devem ser, no essencial, determi- náveis ao nível constitucional, por via de interpretação (cfr. Vieira de Andrade, Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, 5.ª edição, p. 198). Na definição constitucional, os titulares do dever de assegurar o acesso à informação são as entidades que fazem parte da Administração (cfr. n. os 1 e 6 do artigo 268.º). O termo adotado – «Administração» –, por estar enunciado no Título IX, dedicado à Administração Pública, por certo que se quer referir ao conceito básico de «administração pública», o que torna bem complexa a tarefa de delimitar o conjunto dos sujeitos obrigados ao acesso, dada a dificuldade que atualmente existe em determinar o universo das entidades que integram a Admi- nistração Pública, bem como as fronteiras do direito administrativo que forma o seu estatuto. Desde logo, poder-se-á questionar se a noção operativa «Administração», no seu fundamento etimoló- gico, não descreverá realidades que se afastam de um conceito estrito de Administração Pública. De facto, tal formulação contém os meios enunciativos necessários para abranger, na definição de certa doutrina, quer a «Administração indireta pública», constituída por entidades coletivas dotadas de personalidade jurídica de direito público, quer uma «Administração indireta privada», integrada por sociedades de capitais públicos e sociedades de capitais mistos maioritariamente titulados pelo Estado (cfr. Paulo Otero, Vinculação e Liber- dade de Conformação Jurídica do Setor Empresarial do Estado, Coimbra Editora, p. 229). Todavia, delimitar, no plano constitucional, o conjunto dos sujeitos obrigados ao acesso é um problema que exige conhecer em que sentido a Constituição utiliza o conceito de Administração Pública. Tradicionalmente, e seguindo o ensinamento da generalidade dos autores, fala-se de Administração Pública (ou simplesmente da Administração) num duplo sentido: em sentido orgânico ou subjetivo, quando representada por uma ideia organizacional ou institucional, um sistema de órgãos, serviços e agentes; e em sentido material ou objetivo, quando representada por uma ideia de atividade, de tarefa administrativa, que visa a satisfação das necessidades de bem-estar económico, social, cultural e de segurança. Como referem Gomes Canotilho e Vital Moreira, no capítulo relativo à Administração Pública – artigos 266.º a 272.º –, a Constituição utiliza o conceito de Administração Pública nos dois sentidos referidos, pelo que «só no contexto de cada preceito é possível saber qual o sentido utilizado». E se os preceitos, individual- mente considerados, não especificarem o âmbito subjetivo de aplicação, «deve entender-se que os princípios consagrados neste título têm um conteúdo institucional geral, extensivo a todas as formas de Administração Pública, visto que constitucionalmente não existe um princípio de unicidade, mas sim um princípio de plu- ralidade de administrações públicas» (cfr. ob. cit. , Vol. II, p. 793 e 794). 14 . Apesar de não desenvolver um modelo concreto de Administração Pública, deixando ao legisla- dor uma ampla margem de liberdade de escolha das formas de organização jurídico-públicas, a Constitui- ção aceita e garante um sistema administrativo organicamente plural, composto por várias administrações públicas: a administração estadual direta, totalmente dependente do Governo [alínea d) do artigo 199.º]; administração estadual indireta, constituída por entidades públicas que desenvolvem, com personalidade jurídica própria e autonomia, uma atividade administrativa sob a superintendência do Governo [alínea d) ], do artigo 199.º; administração autónoma, constituída por pessoas coletivas de base territorial, associativo ou institucional, sob a tutela do Governo [artigos 199.º, alínea d) , 227.º, 235.º e 267.º, n.º 4]; administração «delegada» ou «concessionada», constituída por entidades privadas, às quais foi confiada a capacidade para
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