TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
264 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de dezembro, faz uma interpretação restritiva da alínea d) do n.º 1 daquele artigo 4.º, de modo a excluir o B. do âmbito de incidência do direito de acesso aos documentos administrativos. Os argumentos que sustentam essa interpretação são dois: (i) «a referência às várias entidades elencadas no artigo 4.º e a afirmação de que são administrativos os documentos que elas possuam arranca de uma espécie de presunção: a de que tais entidades desempenham uma atividade administrativa material, ao menos lato sensu ; (ii) «as empresas públicas estão segmentadas no artigo 4.º da LADA: constam do n.º 1, alínea d), as que emanam diretamente do Estado; constam do n.º 2 do artigo as criadas, secundariamente, por outra empresa pública». A presunção de que as entidades elencadas no artigo 4.º desempenham uma “atividade administrativa material” é extraída da alínea b) do n.º 2 do artigo 3.º da LADA, ao preceituar que «não se consideram documentos administrativos para o efeito da presente lei, os documentos cuja elaboração não releve da ati- vidade administrativa». No que toca às empresas públicas, entende o Supremo que uma tal “presunção” só pode estabelecer-se relativamente àquelas que diretamente emergem do Estado (e das regiões ou autarquias), «enquanto instrumentos de uma administração indireta ao serviço de fins de interesse geral»; ao invés, uma empresa pública que provenha de outra empresa pública pode atuar à margem de quaisquer interesses públi- cos, gerais ou coletivos, «ficando-se por áreas de atividade indiferentes à noção geral e ampla de administra- ção pública». Daí concluir que a ratio de na alínea d) do n.º 1 do artigo 4.º da LADA se aludir a empresas públicas «só deveras se põe e subsiste relativamente àquelas que, como primeira emanação do Estado (e das regiões ou autarquias), devem seguramente incluir-se numa noção lata de administração, aqui indireta. O que já não abrangerá sociedades criadas por empresas públicas, ainda que merecedoras deste qualificativo à luz do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de dezembro». E em abono dessa conclusão o Tribunal invoca que a norma do n.º 2 do artigo 4.º, ao estender as dispo- sições da LADA a certas sociedades financiadas, geridas e controladas pelas «entidades referidas no número anterior», faz uma distinção entre empresas que emanam diretamente do Estado, as que constam da alínea f ) do n.º 1, e as empresas criadas, secundariamente, por outra empresa pública, as referidas naquele n.º 2. Como a norma deste n.º 2 exige que as empresas sejam criadas para satisfazer «necessidades de interesse geral», a B., que atua numa lógica mercantil e concorrencial, não é sujeito passivo do direito de acesso à informação. Ora, esta norma – que não é objeto de fiscalização de constitucionalidade – apesar de ter influência efe- tiva na decisão concretamente tomada, na medida em que se julgou que o B. também não está coberto por ela, foi invocada sobretudo como mais um elemento de interpretação da alínea d) do n.º 1 do artigo 4.º, no sentido de excluir do seu âmbito as empresas públicas criadas por outras empresas públicas. Na interpretação perfilhada pelo acórdão recorrido, apenas as empresas que «emanam diretamente do Estado» estão sujeitas genericamente ao direito de acesso, por se “presumir” que exercem uma atividade de administração pública. Assim, o critério normativo da decisão efetivamente aplicado à dirimição do litígio é que o conceito de «empresa pública» constante da alínea d) do n.º 1 do artigo 4.º da LADA abrange apenas as empresas que emanam diretamente do Estado e não as empresas públicas criadas por outras empresas públicas. O objeto de fiscalização de constitucionalidade está, pois, limitado a este critério normativo e não ao processo hermenêutico através do qual o mesmo foi obtido. Embora o Tribunal possa interpretar as normas legais submetidas ao controlo de constitucionalidade de modo diferente daquele em que elas foram inter- pretadas pela decisão recorrida, porque é livre na interpretação do direito, são insindicáveis os elementos ou fatores que o acórdão recorrido utilizou na determinação da norma aplicável ao caso decidendo. De modo que, apesar de controversos, não são objeto de censura os argumentos invocados no sentido de que: (i) o facto de uma entidade estar referida no artigo 4.º, n.º 1, da LADA não é decisivo para sujeitar ao acesso os documentos que ela produz; (ii) existe uma “presunção” de que as entidades referidas nesse n.º 1 desem- penham uma atividade administrativa material; (iii) essa presunção apenas se aplica às entidades emanadas diretamente do Estado; (iv) a LADA segmenta as empresas em duas classes, as emanadas diretamente do
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