TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015

26 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Na verdade, conforme se escreveu no primeiro dos Acórdãos que fundamenta o pedido de generaliza- ção e para o qual remeteram as subsequentes decisões sumárias: “(…) a norma constante do artigo 97.º do Código do Notariado (como já antes dela a do artigo 106.º) só fica completa quando lida em conexão e inte- grada pela norma sancionatória para que remete e onde consta a moldura penal aplicável ao crime nela tipi- ficado. Incriminação e punição estão em “normativa conexão” e forma uma “unidade intencional”, “já que o delito implica uma certa e correspondente sanção, a sanção pressupõe um certo e correspondente delito (Castanheira Neves, em O princípio da legalidade criminal. O seu problema jurídico e o seu critério dogmático, 1998, p. 6, n.º 11). Daí que a alteração da norma para que é feita a remissão, com a consequente alteração da punição, importe inevitavelmente uma mudança substancial do alcance da norma do artigo 97.º(…)”. Tendo as decisões que apoiam o pedido de generalização negado a possibilidade da previsão do artigo 97.º do Código do Notariado ser considerada autonomamente, devendo sempre ser encarada em “normativa conexão” com a punição, é obrigatório considerar-se que o aditamento ao Código Penal do artigo 348.º-A efetuado pela Lei n.º 19/2013, de 21 de fevereiro, alterou necessariamente o conteúdo da norma que foi objeto dos anteriores julgamentos de inconstitucionalidade. Assim, apenas podendo ser objeto do juízo de generalização a norma anterior à alteração introduzida ao Código Penal pela Lei n.º 19/2013, de acordo com jurisprudência constante e uniforme do Tribunal Cons- titucional, uma declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória e geral só se justificará quando for evidente e manifesta a sua indispensabilidade. No que respeita aos efeitos temporais das declarações de inconstitucionalidade proferidas em sede de fiscalização abstrata sucessiva, rege o artigo 282.º, n.º 1, da Constituição, o qual estabelece, como regra, os efeitos retroativos (ex tunc) deste tipo de decisões, ou seja, os efeitos da decisão do Tribunal Constitucional retroagem à data da entrada em vigor da norma que agora se pretende declarar inconstitucional. Daí que se mantenha o interesse na declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral de normas revogadas ou alteradas na medida em que, “por alguma específica razão relativa à aplicação da lei no tempo, seja de esperar que a norma em causa venha a aplicar-se ainda a um número significativo de casos, ou quando tal se mostre indispensável para corrigir ou eliminar efeitos por elas entretanto produzidos durante o período da respetiva vigência” (ver Acórdãos n. os  497/97, 531/00, 32/02, 404/03, 76/04, 19/07 e 497/07, e 525/08 em www.tribunalconstitucional.pt ) . Os casos julgados estão ressalvados pelo disposto no artigo 282.º, n.º 3, da Constituição, pelo que a eficácia de uma declaração com força obrigatória geral se resumirá às eventuais condutas praticadas antes da alteração efetuada pela Lei n.º 19/2013, de 21 de fevereiro, que sejam denunciadas em juízo e ainda não tenham sido julgados por decisão transitada. Ora, tendo em consideração que as intervenções dos tribunais no julgamento deste tipo de crime são raras, serão meramente residuais as situações em que ainda possa ser aplicado o tipo legal de crime do artigo 97.º do Código do Notariado, antes da alteração introduzida pela Lei n.º 19/2013, de 21 de fevereiro, não deixando de persistir ao dispor dos interessados a via da fiscalização concreta da constitucionalidade, como meio idóneo e suficiente para obviar à aplicação, no seu caso, do preceito referido. Daí que não exista um interesse jurídico relevante na generalização dos juízos de inconstitucionali- dade proferidos pelo Acórdão n.º 379/12 e pelas Decisões Sumárias n. os  120/13, 162/13, 163/13 e 514/13, devendo, por esse motivo, não se conhecer do pedido de generalização deduzido pelo Ministério Público. Por esta razão pronunciei-me pela improcedência do pedido. – João Cura Mariano. DECLARAÇÃO DE VOTO 1. Não acompanho a declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma do artigo 97.º do Código do Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 207/95, de 14 de agosto. São as seguin- tes as razões da minha divergência: i) o pressuposto de que o Acórdão parte quanto à relevância criminal da

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