TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
257 acórdão n.º 117/15 44. Nestes termos, em conformidade com o âmbito normativo do artigo 268.º n.º 2 CRP, a noção de “empresa pública” constante da alínea d) do n.º 1 do artigo 4.º da LADA deve ser interpretada no sentido de abranger todas as empresas que diretamente emergem do Estado, das regiões autónomas ou autarquias, e as empresas que prove- nham de outras empresas públicas, como ocorre com B. em relação às suas agrupadas. 45. Se tal interpretação não vingar, bastará às empresas públicas arranjarem intermediários, como o B., para realizarem os seus negócios de modo absolutamente obscuro e à margem do escrutínio público e, por essa via, deixarem de prestar contas públicas, nomeadamente àqueles que na qualidade de Concorrentes preteridos são diretamente prejudicados por procedimentos de afetação de fundos públicos realizados em violação de limitações jurídico-públicas. 46. O que é particularmente grave no âmbito de contratos milionários suportados por capitais públicos. 47. E é particularmente absurdo numa situação como a presente, em que a empresa de segundo grau (B.) surge do ponto de vista formal como uma pessoa jurídica distinta da de primeiro grau (C.), mas não é uma pessoa jurídica distinta do ponto de vista existencial, patrimonial e funcional. 48. O B. está integralmente funcionalizado à prossecução de tarefas e incumbências que são originariamente das próprias Agrupadas (cfr. cláusula 4.ª dos seus Estatutos Sociais), o objeto social do B. traduz-se integral e exclu- sivamente na prestação de serviços a cada uma das Agrupadas “na medida da respetiva solicitação” (cfr. cláusula 5.ª dos Estatutos Sociais, Doc. 2 em anexo), são as empresas públicas suas Agrupadas que procedem à definição específica da oportunidade, conteúdo, extensão e duração da prestação de serviços, ou outras atividades a realizar pelo Agrupamento a favor de cada Agrupada, assim como as condições dessa prestação (cláusula 6.ª n.º 2 dos Estatutos Sociais). 49. A sede do B. coincide com a sede da C. (cfr. cláusula 2.ª dos Estatutos Sociais e Doc. 2 anexo ao RI) e os interlocutores do B. utilizam endereços de correio eletrónico com o domínio “@c.” no desempenho da sua ativi- dade profissional (cfr. Emails para H. e I. anexos como Docs. 6 a 8). 50. Aliás, a prova de que não é possível diferenciar materialmente as contratações feitas pelo B. das incumbên- cias próprias das suas Agrupadas está na cláusula dos Estatutos Sociais do B. que dispõe que “As atividades que integram o objeto do Agrupamento poderão, também, ser exercidas, individualmente, pelos membros do mesmo (cláusula 6.ª n.º 3 dos Estatutos Sociais). 51. Isto significa que a informação requerida respeita a um tipo de atuação que podia estar a ser desenvolvida individualmente pela C., caso em que, segundo o critério do tribunal recorrido, haveria direito de acesso a tal informação, uma vez que a C. é uma empresa pública diretamente criada pelo Estado. 52. É por isso completamente isenta de fundamentação a interpretação formalista do tribunal recorrido de que apenas a atuação das empresas diretamente emergentes do Estado recai no âmbito de atividade administrativa que o direito à informação que está consagrado no n.º 2 do artigo 268.º da CRP. 53. Repare-se que, pelo facto de que podia ter sido produzida autonomamente por cada uma das empresas públicas Agrupadas, a informação requerida a uma empresa de segundo grau é materialmente idêntica à que a LADA faz recair sobre o conceito de “documento administrativo”! 54. Efetivamente, quando não há diferenciação material entre a atuação de uma empresa de primeiro grau e outra de segundo grau não existe qualquer razão suficiente para isentar esta última empresa do mesmo grau de publicidade, transparência e escrutínio que o direito à informação não procedimental de acesso aos registos e arquivos administrativos impõe à primeira. 55. Esta interpretação é fundamental para induzir todas as empresas públicas a um nível mais exigente de atua- ção, sujeitando-o à lógica da publicidade, da transparência, da igualdade, da justiça e da imparcialidade subjacente ao disposto no artigo 268.º n.º 2 da CRP e expressamente referida no artigo 1.º LADA. 56. Caso a alínea d) do n.º 1 do artigo 4.º da LADA não seja interpretada no sentido de abranger empresas como o B., estar-se-á a veicular uma interpretação contrária ao fim jurídico-constitucionalmente protegido pelo direito à informação não procedimental de acesso aos registos e arquivos administrativos visa salvaguardar consa- grado no n.º 2 do artigo 268.º da CRP.
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=