TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015

255 acórdão n.º 117/15 instrumento para intervir no espaço social, por meio de uma intervenção indireta que representa “uma intervenção pública”. 21. Neste sentido, as imposições de venda de participações sociais que o Programa do atual Governo faz recair sobre a C. resultam em consequências drásticas para o B., que terá de alterar a sua constituição, uma vez que as Agrupadas E., S. A. e a D., S. A. deixarão de pertencer ao grupo C. em virtude da sua futura privatização. 22. Por tudo isto, é manifestamente infundado o juízo do tribunal recorrido segundo o qual o B. pode “per- feitamente atuar à margem de quaisquer interesses públicos, gerais ou coletivos, ficando-se por áreas de atividade indiferentes à noção geral e ampla de administração pública.” 23. Segundo o atual estádio de evolução conceptual, de que os referidos acórdãos são paradigmáticos, está consolidado o entendimento de que as empresas públicas – emergentes ou não diretamente do Estado – não ficam eximidas de observar vinculações jurídico–públicas, designadamente o direito de acesso à informação consagrado no n.º 2 do artigo 268.º da CRP, porque são também elas parte integrante da Administração Pública em sentido orgânico e desenvolvem parcialmente uma atividade materialmente administrativa. 24. Neste sentido, a recorrente invoca o entendimento atualista acerca das limitações jurídico-públicas que impendem sobre empresas públicas sob forma privada, que tem sido veiculado para delimitar o alcance subje- tivo passivo do direito à informação constitucionalmente consagrado, pela Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos, pela doutrina e pela jurisprudência, designadamente pelo Acórdão do Tribunal Constitucio- nal n.º 496/2010 (proc. n.º 964/09), o qual veio confirmar o anterior julgamento do Supremo Tribunal Admi- nistrativo que, em recurso excecional de revista, havia decidido nesse mesmo sentido (Ac. STA de 30.09.2009, proc.º 0493/09), tal como anteriormente o havia feito o Tribunal Central Administrativo do Sul (Ac. TCAS de 12.03.2009, proc.º 04818/09). 25. Aliás, o acórdão recorrido decidiu no pressuposto de que a forma de “Agrupamento Complementar de Empresas”, sob a qual é constituído o B., é irrelevante para efeitos de qualificação ou não como empresa pública, e efetivamente os ACE são equiparados por lei às sociedades comerciais, para fins de registo, e o seu regime jurídico supletivo é o das sociedades comerciais em nome coletivo, hoje sociedades anónimas (cfr. artigo 4.º e 20.º do DL 430/73, que aprovou o Regime dos Agrupamentos Complementares de Empresas). 26. Logo, se tanto as Agrupadas (em nome e por conta de quem o B. produziu e detém a informação reque- rida), como o próprio B., constituem do ponto de vista subjetivo e material empresas públicas, de véu privado mas de substrato público, não há razão material suficiente para não as sujeitar indiferenciadamente ao respeito e à concretização do direito de acesso à informação que está consagrado no n.º 2 do artigo 268.º da CRP. 27. Situação idêntica a esta foi assim enquadrada pelo supra citado acórdão do Tribunal Constitucional n.º 496/2010, de 15.12.2010, proc.º 964/09, que considerou “empresa pública” a E., S. A., cujo capital é, na sua totalidade, detido pela G., SGPS, S. A., esta sim diretamente detida a 100% pelo Estado, tal como a C.. 28. No já referido artigo publicado após a apresentação das alegações deste recurso, Miguel Assis Raimundo convoca o alargamento do conceito de empresa pública fruto de uma interpretação conforme do direito nacional ao direito euro-comunitário (in Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 98, p. 45). 29. Segundo esta jurisprudência e doutrina, ao contrário do que o Acórdão recorrido parece fazer crer, os princípios da igualdade entre operadores económicos ou da concorrência não justificam a exclusão das empresas públicas do âmbito de sujeição do direito de acesso à informação consagrado no n.º 2 do artigo 268.º da CRP; 30. Isto porque a atuação das empresas públicas sob forma jurídico-privada está publicizada, ie, sujeita a limita- ções jurídico-públicas, que introduzem um desvio à lógica puramente privada da sua atuação mesmo quando esta obedece a uma lógica concorrencial. 31. Valores como imparcialidade, objetividade, racionalidade decisória, exigência de fundamentação, «accoun- tability», «fairness», constituem, em conjunto com os direitos fundamentais, alguns dos valores de direito público que o direito privado incorporou, num fenómeno que a doutrina designa por “publicização do direito privado. 32. In casu, a atuação do B. é necessariamente publicizada pela sujeição ao Código de Conduta da C. e aos seus próprios Estatutos Sociais, que confirmam que a intervenção do B. no procedimento de Consulta supra referido

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