TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
243 acórdão n.º 113/15 Contudo, tem sido também entendimento reiterado do Tribunal Constitucional que, embora esteja vinculado a criar meios jurisdicionais de tutela efetiva dos direitos e interesses ofendidos dos cidadãos, “o legislador não deixa de ser livre de os conformar, não sendo de todo o modo obrigado a prever meios iguais para situações diversas, considerando ainda que a identidade ou diversidade das situações em presença háde resultar de uma perspetiva global que tenha em conta a multiplicidade de interesses em causa, alguns deles conflituantes entre si” (cfr. Acórdão n.º 63/03). Este direito geral à tutela jurisdicional efetiva é concretizado, no âmbito da justiça administrativa, atra- vés da consagração, no artigo 268.º da Constituição, de um conjunto de garantias dos particulares em face da Administração, onde se inclui «o direito de impugnar quaisquer atos administrativos que os lesem» (cfr. o n.º 4 do artigo 268.º da Constituição). Conforme se escreve, a este respeito, no Acórdão n.º 329/13 do Tribunal Constitucional «embora subordinado a um imperativo de efetividade, na vertente da garantia que agora está em consideração – a impugnação de quaisquer atos administrativos que os (aos direitos ou interesses legalmente protegidos dos administrados) lesem –, o que decorre do n.º 4 do artigo 268.º da Constituição é o dever de conformar o processo impugnatório de tal modo que seja idóneo a apreciar a pretensão de invalidade (ou de inexistência jurídica) incidente sobre as decisões dos órgãos da Administração (ou dotados de poderes materialmente administrativos) que, ao abrigo de normas de direito público, visem produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta». A solução, prevista na norma cuja interpretação normativa é sindicada nos autos, de excluir do âmbito da justiça administrativa a apreciação de litígios que tenham por objeto a impugnação de atos praticados no exercício da função política e legislativa, tem sido abordada na perspetiva da delimitação das funções esta- duais, designadamente, entre a função administrativa e a função política e legislativa. A consequência desta delimitação é que, em princípio, os tribunais administrativos fiscalizam apenas a legalidade dos atos pratica- dos no exercício da função administrativa, mas já não os que o tenham sido no exercício da função política e legislativa [cfr., a este respeito, entre outros, Mário Aroso de Almeida, em Manual de Processo Administrativo, pp. 183-184, edição de 2013, Almedina e Vieira de Andrade, em A justiça administrativa (Lições), pp. 58 e segs., edição de 2009, Almedina]. A este propósito, Vieira de Andrade [cfr., A justiça administrativa (Lições), ob. cit. , p. 59] escreve o seguinte: «Quanto aos atos da função legislativa, não havendo entre nós, uma reserva material ou funcional de regula- mento, nada impede o legislador de estabelecer regimes jurídicos pormenorizados, tendo de considerar-se como atos legislativos – e, portanto, subtraídos à jurisdição administrativa – quaisquer disposições gerais e abstratas editadas sob a forma de diploma legislativo (mesmo de decreto-lei, tendo em conta que o Governo exerce tanto a função administrativa como a função legislativa), ainda que tenham caráter regulamentar e, portanto, pertençam materialmente à função administrativa. Já o mesmo não acontece com os atos administrativos (individuais e concretos), que podem ser impugnados perante os tribunais administrativos independentemente da sua forma, mesmo que constem de um diploma legis- lativo. Contudo, dado que não estão proibidas as leis-medida (também concretas ou individuais), o problema dos limites da jurisdição administrativa passa aqui pela distinção substancial entre as funções estaduais – concreta- mente, pela distinção entre “ato administrativo” e “lei-medida”». Neste mesmo sentido, Mário Aroso de Almeida ( cit., p. 183) afirma que não é possível «proceder à impugnação direta de atos legislativos nos tribunais administrativos – isto, a menos que esses atos, emanados sob a forma de ato legislativo, contenham decisões materialmente administrativas e não sejam, por isso, nessa parte, do ponto de vista material, manifestação do exercício da função legislativa, pois, nesse caso, a impugnação é possível, como resulta do artigo 52.º, n.º 1, e da própria Constituição, que, no artigo 268.º, n.º 4, consagra a impugnabilidade de todos os atos administrativos, independentemente da sua forma».
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