TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
235 acórdão n.º 113/15 ler-se com o sentido de que não abarca no âmbito da sua previsão excludente, as leis-medida ou as leis individuais e concretas restritivas de direitos liberdades e garantias, dado que esse resultado interpretativo não tem na letra da lei um mínimo de correspondência verbal (artigo 9.º/2 C. Civil). Razão pela qual, por ser inútil para a decisão sobre a competência, se torna ocioso determinar a “exata determinação da espécie, dentro do género legislativo” e/ou indagar se o ato legislativo impugnado comporta, ou não, qualquer restrição aos direitos, liberdades e garantias». 2. Normas e princípios constitucionais que se considera terem sido violados: A interpretação e aplicação da norma do artigo 4.º, n.º 2, alínea a) , do ETAF, no sentido explanado no ponto 1, supra, adotado pela decisão recorrida, viola os princípios da constitucionalidade e tutela jurisdicional efetiva, consagrados nos artigos 3.º, n.º 3, 18.º, n.º 3, 20.º e 268.º, n.º 4, da Constituição, porquanto, para além do mais, torna possível que o Governo, que dispõe simultaneamente de competência administrativa e legislativa, opte por aprovar diretamente leis-medida, ou mesmo leis individuais e concretas, restritivas dos direitos constitucionais dos particulares, em vez de emitir um regime legal e praticar depois atos administrativos ao seu abrigo, conseguindo dessa forma, a confirmar-se o entendimento contido no Acórdão recorrido, praticar atos judicialmente inexpug- náveis (…).” A recorrente apresentou alegações, tendo formulado as seguintes conclusões: «1.ª A questão de constitucionalidade normativa objeto do presente recurso é a norma do artigo 4.º, n.º 2, alínea a) , do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, interpretado e aplicado no sentido de que, con- cluindo-se que o ato impugnado tem natureza legislativa, a sua sindicância não cabe no âmbito da jurisdição administrativa, sem que seja necessário apurar qual a exata espécie dentro do género legislativo que está em causa, designadamente uma lei-medida ou uma lei individual restritiva dos direitos, liberdades e garantias, viola as normas e princípios consagrados nos artigos 3.º, n.º 3, 18.º, n.º 3, 20.º e 268.º, n.º 4, da Constituição. 2.ª O intuito de obter a conformidade dos atos do poder público com a Constituição é posto em causa se o Governo puder praticar atos individuais sob forma legislativa que sejam restritivos de direitos, liberdades e garan- tias, mas cujo conhecimento seja vedado aos tribunais administrativos em virtude do disposto no artigo 4.º, n.º 2, alínea a) , do ETAF. 3.ª Não se ignora que a função do artigo 4.º, n.º 2, alínea a) , do ETAF não consiste apenas em delimitar a competência dos tribunais administrativos em face dos demais poderes do Estado, mas também em delimitar a competência destes tribunais em face da competência própria do Tribunal Constitucional, pelo que admitir-se a interpretação da norma objeto do presente recurso no sentido de a mesma excluir do seu âmbito de previsão os atos individuais sob forma legislativa restritivos de direitos, liberdades e garantias, poderia equivaler a atribuir aos tribunais administrativos uma competência que excede o controlo incidental e se aproximaria de um controlo concreto de direitos fundamentais que seria depois objeto de um recurso direto de constitucionalidade, ou queixa constitucional, em termos próximos da Veifassungsbeschwerde alemã ou do recurso de amparo espanhol. 4.ª A objeção referida na conclusão anterior não procede, uma vez que no âmbito do presente recurso não está em causa qualquer interpretação normativa do artigo 4.º, n.º 2, alínea a) , do ETAF suscetível de conduzir a um controlo principal de um ato individual restritivo de direitos, liberdades e garantias sob forma legislativa cuja anulação é pedida a um tribunal administrativo, mas apenas a desaplicação do mencionado ato no caso concreto, com fundamento em inconstitucionalidade, cabendo sempre recurso para o Tribunal Constitucional. 5.ª Apenas na hipótese prevista no artigo 72.º, n.º 2, do CPTA, que pretendeu afastar a possibilidade de um tribunal administrativo declarar a inconstitucionalidade de uma norma administrativa com força obrigatória geral, é que se poderia falar de um conflito entre a competência dos tribunais administrativos e a competência própria do Tribunal Constitucional. 6.ª A possibilidade de, num processo conduzido nos tribunais administrativos, existir uma coincidência entre o ato cuja anulação se solicita e a norma recortada para efeitos de recurso de constitucionalidade, não é inédita, tendo o Tribunal Constitucional, através do seu Acórdão n.º 81/92, proferido em sede de fiscalização concreta de
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