TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015

218 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL ambiente teria de se demonstrar que esses instrumentos não permitem resolver as situações de gestão necessárias à realização da missão pública. O que não foi feito. Invoca-se, ainda, a restrição injustificada da autonomia organizativa local, por se empurrar os municípios a adotarem o formato da empresa local para a prestação dos serviços suscetíveis de serem prestados por serviços municipalizados. Desde há muito que os municípios têm à sua disposição vários formatos organizativos para a prestação desses serviços, entre eles, a prestação direta, a municipalização, a empresarialização, a externalização, a concessão ou a parceria. Desde há muito que sabem também que a cada formato organizativo corresponde um regime e um conjunto determinado de regras e que a sua escolha se faz ponderando as vantagens e desvantagens de cada modelo face aos contornos que em cada momento ele assume. Desde há muito que o regime correspondente aos serviços municipalizados é balizado pelas regras administra- tivas e de contabilidade pública. Não se pode concluir que a evolução dessas regras reduza a autonomia de escolha relativamente aos formatos a adotar, já que ela tão só coloca em cima da mesa novos elementos a considerar. Termos em que se conclui não existir a inconstitucionalidade invocada.» 9. Nessa sequência, o recorrente suscita perante este Tribunal a inconstitucionalidade da submissão às limitações e controlo decorrente da LCPA, e do diploma que a desenvolve, os serviços municipalizados, mormente àqueles cujo objeto verse a exploração mercantil dos transportes urbanos de passageiros, como é o caso dos serviços municipalizados de transporte urbano de Coimbra. Na sua ótica, tal abrangência infringe o princípio da autonomia das autarquias locais, numa dimensão de garantia institucional de livre iniciativa económica municipal. E, para consubstanciar tal garantia, o recorrente invoca os princípios fundamentais de organização económica enunciados nas alíneas b) – princí- pio da coexistência ou compatibilidade entre setores, assegurando a possibilidade de opção entre a iniciativa económica pública e privada – e c) – princípio de liberdade de iniciativa e de organização empresarial no âmbito de uma economia mista – do artigo 80.º, a que associa uma reserva aos poderes públicos de setores básicos da economia, ao abrigo do artigo 86.º, n.º 3, normas que, por sua vez, conjuga com os princípios gerais do poder local contidos nos artigos 235.º (âmbito da garantia institucional da autonomia local), 237.º (atribuições e organização das autarquias locais) e 238.º (autonomia financeira das autarquias locais), todos da Lei Fundamental. 10 . OTribunal Constitucional pronunciou-se por diversas vezes sobre a garantia constitucional da auto- nomia local, em particular, da autonomia financeira e patrimonial das autarquias locais (cfr. Artur Maurício, “A garantia constitucional da autonomia local à luz da jurisprudência do Tribunal Constitucional”, relatório apresentado em novembro de 2002, acessível em www.tribunalconstitucional.pt ; também in Estudos em home- nagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa, Coimbra, 2003, pp. 625-657). Fê-lo, designadamente, no Acórdão n.º 432/93, em que disse: «(…) 1.2 – As autarquias locais concorrem, pela própria existência, para a organização democrática do Estado. Justi- ficadas que são pelos valores da liberdade e da participação, as autarquias conformam um “âmbito de democracia” (Ruiz Miguel), num sistema que conta precisamente com o princípio básico de que toda a pessoa tem direito de participar na adoção das decisões coletivas que a afetam. A Constituição define-as como “pessoas coletivas territoriais dotadas de órgãos representativos, que visam a prossecução de interesses próprios das populações respetivas” (cfr. CRP, artigo 237.º). Não lhes traça um figurino de mera administração autónoma do Estado. Deixa claro o “sentido político que adquire o exercício das suas fun- ções” (Jorge Miranda), que as autarquias “constituem também uma estrutura do poder político” (Gomes Canotilho

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