TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
216 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Confrontado com a recusa de visto decidida pelo Acórdão n.º 2/13, 1.ª S/SS, o recorrente interpôs recurso perante o plenário da 1.ª secção, sustentando que o âmbito subjetivo de aplicação da LCPA e do Decreto-Lei n.º 127/2012 era definido por referência tão só às entidades (classificadas e reclassificadas) que façam parte do setor público administrativo e de acordo com os critérios estabelecidos no Sistema Europeu de Contas (SEC 95). E, assim sendo, por aplicação de tais critérios, aos serviços municipalizados de trans- portes urbanos de Coimbra não seria aplicável o regime estatuído naqueles diplomas. E, nessa sede, suscitou a inconstitucionalidade da aplicabilidade da LCPA e do Decreto-Lei n.º 127/2012 aos serviços municipali- zados de transportes urbanos. Diferentemente, o tribunal a quo entendeu que o artigo 2.º, n.º 1, da LCPA remete para o artigo 2.º da Lei de Enquadramento Orçamental e que, regulando esse preceito também o subsetor local do setor público administrativo, as entidades nele integradas, como entendeu ser o caso dos serviços municipalizados, encon- tram-se naturalmente abrangidas pelo referido reenvio normativo, ficando consequentemente sujeitas a uma aplicação integral – i. e. tanto dos princípios como das regras – da LCPA e do Decreto-Lei n.º 127/2012. E, por considerar infringida a exigência constante do artigo 5.º, n.º 1, da LCPA, e do artigo 7.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 127/2012 – à qual atribuiu a natureza de princípio essencial, aplicando-se então tanto às entidades abrangidas no n.º 1 do artigo 2.º, como àquelas previstas no n.º 2 do preceito –, confirmou a decisão de recusa do visto. Quanto à questão de constitucionalidade suscitada pelo recorrente, entendeu o Tribunal de Contas o seguinte: «(…) A recorrente invoca ainda que a interpretação do acórdão recorrido, segundo a qual a LCPA e o Decreto- -Lei n.º 127/2012 são aplicáveis aos serviços municipalizados de transportes urbanos de Coimbra, é inconstitucio- nal por constituir uma excessiva e injustificada “restrição da autonomia económico-financeira e organizativa dos municípios (de escolha do formato organizativo adequado à iniciativa económica municipal em causa), violando a garantia institucional da livre iniciativa económica municipal consubstanciada nos artigos 80.º, alínea b) e c) e 86.º, n.º 3, e (conjugadamente) artigos 235.º, 237.º e 238.º CRP”. No parecer junto ao recurso diz-se a este respeito: “(...) A interpretação do Tribunal de Contas mais não vem fazer do que, por assim dizer, «castigar» o Município de Coimbra por ter escolhido (ou mantido a escolha) do formato Serviço Municipalizado, de entre os dois formatos possíveis de que se pode revestir a respetiva atividade empresarial (o formato publicístico do Serviço Municipalizado e o privatístico da Empresa Local constituída ao abrigo da lei comercial e sujeita em primeira linha ao direito privado – cfr. artigo 2.º da Lei n.º 50/2012, de 31 de agosto, Regime Jurídico da Atividade Empresarial Local). Com efeito, a vingar este entendimento (...), o formato serviço municipalizado estará pura e simplesmente condenado para aquelas atividades empresariais que impliquem a cobrança aos utentes dos bens ou serviços prestados a preços economicamente significativos (...). É que deixando a empresa municipal com tal formato de poder beneficiar de margem mínima de manobra (em matéria de gestão de tesouraria) que a lei garante a esta categoria de entidades (ditas «sociedades mercantis») na gestão corrente da respetiva atividade, então outro remédio não restará aos municípios que não a adoção da forma societária e a sujeição em primeira linha ao direito privado, através do formato «Empresa Local». Mas este resultado da interpretação do Tribunal de Contas não é, alem do mais, constitucionalmente admissível, por contender com a vertente da autonomia organizativa dos municípios objeto também da garan- tia constitucional (institucional). Na verdade, quase todas as atividades desenvolvidas em setores básicos da economia reservados aos poderes públicos, ao abrigo do artigo 86.º, n.º 3, CRP – nomeadamente de produção e prestação de bens e serviços essenciais ou de interesse económico geral – estão reservados ao poder local, designadamente aos municí- pios: são, a saber, os casos do abastecimento público de água, do saneamento de águas residuais, da recolha e
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