TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
215 acórdão n.º 109/15 controlo de compromissos e pela sobrestimação recorrente das receitas orçamentadas, permitindo, no quadro dos procedimentos atuais, comprometer despesa durante a execução orçamental muito para além da efetiva capacidade de pagamento dessa despesa. A interrupção de acumulação de dívidas implica a adoção de procedimentos mais estritos e de emergência visando o controlo dos compromissos assumidos pelas entidades públicas. Atualmente, o enfoque do controlo da despesa é colocado nos pagamentos. A eficácia do controlo obriga, no entanto, a que este seja antecipado para o momento da assunção do compromisso, momento a partir do qual a despesa é incorrida, não havendo alternativa que não seja o pagamento. A ausência de registo da fatura, ou equivalente, no sistema contabilístico ou, simples- mente, o não pagamento, apenas conduzem à acumulação de pagamentos em atraso. Assim, torna-se necessário aprovar um novo modelo legislativo que permita inverter a tendência de acumulação de dívida. (…).» E, mais à frente: “O princípio fundamental é o de que a execução orçamental não pode conduzir à acu- mulação de pagamentos em atraso.” Nas palavras de Joaquim Freitas Rocha, Noel Gomes e Hugo Flores da Silva, os objetivos ou finalidades da LPCA são, assim, claros: “por um lado, criar regras que impeçam o nascimento de novos pagamentos em atraso e, por outro, reduzir o volume presentemente existente e acumulado de pagamentos em atraso, tudo sem perder de vista a possibilidade de responsabilizar, nos termos legalmente prescritos, os atores e entidades pelos atos ilegais e financeiramente reprováveis respetivos” ( Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atraso, Coimbra Editora, 2012, pp. 34-35). Temos, então, que a LCPA alterou o foco de controlo da despesa pública, deslocando-o do momento do pagamento para o momento da assunção do compromisso. Enquanto que anteriormente se privilegiava a fase de pagamento, em que não existia juridicamente outra opção que não fosse a sua efetivação, com a entrada em vigor da LCPA o principal enfoque do controlo passou a ser efetuado ao nível (e no momento) da assunção do compromisso, sem, contudo, descurar uma fiscalização posterior e a responsabilidade dos agentes públicos decisores. Assim, e por forma a atingir esse desiderato, a LCPA impõe, no seu artigo 5.º, n.º 1, na redação con- ferida pela Lei n.º 64/2012, de 20 de dezembro, que “os titulares de cargos políticos, dirigentes, gestores e responsáveis pela contabilidade não podem assumir compromissos que excedam os fundos disponíveis”, enquanto o artigo 7.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 127/2012, acolhe a mesma obrigação, de acordo com a qual: “Os compromissos assumidos não podem ultrapassar os fundos disponíveis”. Importa notar que o diploma concretiza o conceito de fundos disponíveis, enquanto limite quantitativo à assunção de obrigações de efe- tuar pagamento a terceiros em contrapartida do fornecimento de bens e serviços ou da satisfação de outras condições, de acordo com o disposto na alínea f ) , subalíneas i) a vii) do artigo 3.º da LCPA, e no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 127/2012. Abrange, pois: i) A dotação corrigida líquida de cativos, relativa aos três meses seguintes; ii) As transferências ou subsídios com origem no Orçamento do Estado, relativos aos três meses seguintes; iii) A receita efetiva própria que tenha sido cobrada ou recebida como adiantamento; iv) A previ- são da receita efetiva própria a cobrar nos três meses seguintes; v) O produto de empréstimos contraídos nos termos da lei; vi) As transferências ainda não efetuadas decorrentes de programas e projetos do Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN) cujas faturas se encontrem liquidadas, e devidamente certificadas ou validadas; vii) Os montante de aumento temporário dos fundos disponíveis autorizados nos termos do artigo 4.º da LCPA. Comporta ainda, nos termos n.º 3 do artigo 3.º da LCPA, os saldos transitados do ano anterior e recebimentos em atraso. 8. Para melhor compreensão da questão de constitucionalidade em apreço é necessário referir os termos da discussão que conduziu à aplicação na decisão recorrida da dimensão normativa impugnada e, nesse pressuposto, do disposto nos artigos 5.º, n.º 1, da LCPA e 7.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 127/2012, de 21 de junho.
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