TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
199 acórdão n.º 101/15 4. Resta resolver a segunda questão, relativa à norma constante do n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 5/2002. A Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro, estabelece medidas de combate à criminalidade organizada e eco- nómico-financeira. Para tanto, define um regime especial de recolha de prova, quebra de sigilo profissional e perda de bens a favor do Estado (o sublinhado é nosso) que se aplica aos crimes constantes do elenco fixado no seu artigo 1.º Dentro desses crimes encontra-se, precisamente, o lenocínio [alínea i) do n.º 1 do artigo 1.º da Lei n.º 5/2002]. No que ao regime especial de perda de bens a favor do Estado diz respeito, releva a seguinte disposição do n.º 1 do artigo 7.º: «Em caso de condenação pela prática de crime referido no artigo 1.º, e para efeitos de perda de bens a favor do Estado, presume-se constituir vantagem da atividade criminosa a diferença entre o valor do património do arguido e aquele que seja congruente com o seu rendimento lícito.» Sustenta o recorrente que é inconstitucional esta norma, por entender que a «presunção» que nela se estabelece implica a «consignação da inversão o ónus da prova ou da presunção de inocência», em violação das garantias de processo criminal que são consagradas no artigo 32.º da CRP. Não tem razão o recorrente. Na verdade, in casu , a «presunção» contida no n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 5/2002 apenas opera após a condenação, em nada contrariando, pois, a presunção de inocência, consagrada no n.º 2 do artigo 32.º da CRP. Além do mais, trata-se de uma presunção ilidível, como são todas as presunções legais exceto quando o legislador disponha em contrário (artigo 350.º, n.º 2, do Código Civil). O princípio de que parte o legislador ao estabelecê-la – princípio cuja não verificação o recorrente sempre poderia ter demonstrado – é o de que ocorreu no caso um ganho ilegítimo, proveniente da atividade criminosa, compreensivelmente reportada ao rendimento do condenado que exceda o montante do seu rendimento lícito. Assim, não há senão que concluir pela improcedência do recurso. III – Decisão Pelos fundamentos expostos decide-se: a) Não conhecer da questão de constitucionalidade relativa aos artigos 169.º e 178.º do Código Penal; b) Não julgar inconstitucional a norma constante do n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro, que estabelece que, no caso de condenação pelo crime de lenocínio, (…) «para efeitos de perda de bens a favor do Estado, presume-se constituir vantagem de atividade criminosa a diferença entre o valor do património do arguido e aquele que seja congruente com o seu rendimento lícito»; c) Em consequência, negar provimento ao recurso. Custas pelo recorrente, fixadas em 20 unidades de conta da taxa de justiça. Lisboa, 11 de fevereiro de 2015. – Maria Lúcia Amaral – Maria de Fátima Mata-Mouros – João Pedro Caupers [parcialmente vencido quanto à alínea a) ] – Joaquim de Sousa Ribeiro. Anotação: Acórdão publicado no Diário da República , II Série, de 26 de março de 2015.
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