TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
190 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL é constitucionalmente garantido pelo referido princípio fundamental da liberdade de escolha do género de trabalho, liberdade esta que é também violada pela «ação de reconhecimento de existência de contrato de trabalho». O n.º 1 do artigo 47.º da Constituição, que a decisão recorrida entende ter sido violado, garante a todos «o direito de escolher livremente a profissão ou o género de trabalho, salvas as restrições legais impostas pelo interesse coletivo ou inerentes à sua própria capacidade». A liberdade de escolha de profissão, consagrada nesta norma, para além da faculdade de escolher livre- mente a profissão desejada, abrange, na sua dimensão positiva, vários níveis de realização, incluindo a obten- ção das habilitações académicas e técnicas para o exercício da profissão, o ingresso na profissão e o exercício da profissão, sendo de entender que o exercício livre da profissão está igualmente inserido no âmbito norma- tivo de proteção do artigo 47.º, n.º 1. Como salientam Jorge Miranda e Rui Medeiros ( Constituição Portuguesa Anotada, I, 2.ª edição, Coim- bra, 2010, p. 967) «não obstante o artigo 47.º, n.º 1, só se referir ao direito de escolha livre da profissão ou do género de trabalho, a escolha, que toca a questão do se uma profissão é assumida, continuada ou abandonada (realização de substância), pressupõe o exercício, que se refere à questão do como (realização da modalidade), da mesma maneira que a segunda de nada valeria sem a primeira». E ainda segundo estes autores ( Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, 2.ª edição, pp. 965-966), numa dimensão positiva, a liberdade de escolha de profissão compreende diversas pretensões específicas, entre as quais «o direito de escolher o regime de trabalho – o trabalho independente, o trabalho subordinado por conta de qualquer empresa, a função pública ou trabalho subordinado por conta do Estado ou de outra entidade pública e a própria iniciativa económica (artigo 61.º), esta na medida em que a iniciativa ou a ges- tão de uma atividade empresarial (provada, cooperativa ou autogestionária) pressupõe, além de outras, uma escolha do género ou tipo de trabalho». Conforme decorre da respetiva fundamentação, é esta a dimensão do direito de escolher livremente a profissão ou o género de trabalho que a decisão recorrida entende ter sido violada pelo regime da «ação de reconhecimento de existência de contrato de trabalho». No entanto, é manifesto que tal regime legal não coloca em causa este direito. Com efeito, o que se pretende com o mesmo não é impor a quem presta determinada atividade remunerada que o faça, contra a sua vontade, em regime de contrato de trabalho, mesmo que o pretenda fazer em regime de trabalho inde- pendente. Conforme se viu, o que se pretende é combater a utilização indevida do contrato de prestação de serviço nas situações em que, apesar de determinada relação ser formalmente titulada pelas partes como contrato de prestação de serviço, corresponda, substancialmente, a uma situação de trabalho subordinado, à qual deveria, por isso, ser aplicado o regime laboral. Nas situações problematizadas na decisão recorrida (os casos em que uma pessoa não quer estar sujeita a nenhuma relação de subordinação jurídica ou em que está vinculada a uma relação jurídica de um específico tipo contratual que não lhe permite ter uma ou outra relação jurídica de natureza laboral), não se verifica um caso de utilização indevida do contrato de prestação de serviço, visto que, nenhuma das partes (e, concretamente, quem presta a outrem determinada atividade remunerada) pre- tende que a relação jurídica em causa esteja sujeita ao regime laboral. Nestas situações, o referido regime contém suficientes garantias de esta vontade do trabalhador poder ser expressa nos autos e levada em conta, de modo a que tal situação não seja tratada como sendo um caso de trabalho subordinado. Com efeito, o artigo 186.º-L, n.º 4, do Código de Processo do Trabalho, determina que, simultanea- mente com a notificação da data da audiência de julgamento, sejam remetidos ao trabalhador o duplicado da petição inicial e da contestação, simultaneamente «com a expressa advertência de que pode, no prazo de 10 dias, aderir aos factos apresentados pelo Ministério Público, apresentar articulado próprio e constituir mandatário» e o artigo 186.º-O, também do Código de Processo do Trabalho prevê, no seu n.º 1, que «[s]
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