TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
180 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Trabalho, por violação dos princípios constitucionais do Estado de Direito Democrático, consagrado no artigo 2.º da CRP, nas suas vertentes dos princípios da segurança jurídica e da confiança; da liberdade de escolha do género de trabalho, plasmado no artigo 47.º, n.º 1 da CRP; e da igualdade, previsto no artigo 13.º, da CRP. Nos termos do acabado de explanar, deverá o Tribunal Constitucional conceder provimento ao presente recurso, assim fazendo a costumada justiça.» A recorrida apresentou contra-alegações, tendo concluído da seguinte forma: «1.ª A ação especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho é de simples apreciação positiva, estando o objeto do processo limitado à qualificação do vínculo contratual. 2.ª A possibilidade conferida a terceiro de, sem interesse dos contraentes, nem conflito entre eles, convocar a tutela jurisdicional do Estado para qualificar o vínculo que estes mantêm, num ordenamento jurídico caracterizado pela liberdade contratual e autonomia da vontade, infringe a proteção da confiança ínsita no princípio do Estado de Direito democrático. 3.ª Atento o objeto do processo, inexiste interesse público naquela qualificação, já que desta não decorrem efei- tos de Direito para outras relações jurídicas conexas com o trabalho autónomo ou subordinado, designadamente de natureza tributária ou previdencial. 4.ª A ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho não prossegue interesse público, o Minis- tério Público não é o seu autor, nem a sua posição processual prevalece sobre a do putativo trabalhador. 5.ª Interpretação que reconhecesse ao Ministério Público a autoria da mencionada ação, remetendo o putativo trabalhador para papel meramente acessório ou de assistência e subordinando a vontade deste à posição prevale- cente do Ministério Público, designadamente para efeitos de conciliação a realizar em sede de audiência de partes, infringiria a conformação constitucional de situações jurídicas ainda decorrente do Estado de Direito democrático, como a liberdade de escolha do género de trabalho ou o direito a tutela jurisdicional efetiva mediante processo equitativo, bem como, noutro plano, a liberdade de iniciativa económica. 6.ª Interpretação com esse sentido infringiria o direito de ação na medida em que a vontade prevalecente na composição de interesses subjacente ao litígio judicial, desde o momento da convocação da tutela jurisdicional até à definição da situação jurídica por sentença, pertenceria a terceiro que não é parte na relação material controvertida, em ação que se limita a qualificar a fonte desta. 7.ª E poria em causa a liberdade de escolha do género de trabalho porque a prestação oferecida a título pro- fissional seria reconduzida a modelo contratual típico ( in casu , o contrato de trabalho) por efeito de vontade de terceiro, sem consideração pelos interesses específicos de quem a realiza, nem pelas opções tomadas aquando do respetivo exercício. 8.ª A mesma liberdade de escolha do género de trabalho é postergada pela circunstância de a tramitação pro- cessual em apreço permitir que um sujeito de Direito veja declarada a existência de contrato de que é parte, sem ter tido oportunidade de conhecer a existência da sujeição a juízo da correspondente pretensão, nem de sobre ela se pronunciar. 9.ª Diversas soluções normativas da ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho – a designa- ção dada à ação e respetivas partes, o efeito cominatório pleno da revelia do réu, as limitações probatórias, o regime de custas – revelam tratamento desequilibrado e parcial dos sujeitos processuais, que infringe o direito a processo equitativo. 10.ª A ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho pode obstar ao exercício pleno do direito a advogado, contrariando o valor da tutela jurisdicional efetiva de que aquele direito constitui corolário. 11.ª A promoção processual obrigatória da participação da Autoridade para as Condições do Trabalho que dá início à instância na ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho, é contrária ao princípio cons- titucional da autonomia do Ministério Público,
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