TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
178 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional: I – Relatório O Ministério Público instaurou no Tribunal do Trabalho de Lisboa, ao abrigo do artigo 15.º-A da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro, e dos artigos 186.º-K e 186.º-L do Código de Processo do Trabalho (CPT), ação declarativa de reconhecimento de existência de contrato de trabalho contra A., S. A., pedindo que fosse declarada a existência de um contrato de trabalho entre a trabalhadora B. e a ré. OTribunal do Tribunal de Lisboa proferiu despacho saneador em 17 de julho de 2014, no qual, conhe- cendo da questão da inconstitucionalidade dos artigos 26.º, n.º 1, alínea i), e n.º 6, e 186.º-K a 186.º-R do CPT, suscitada pela ré, decidiu recusar a aplicação das referidas normas com fundamento na sua inconstitu- cionalidade e, em consequência, absolver a ré da instância. O Ministério Público recorreu desta decisão para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), pedindo a fiscalização da constitucionalidade das normas cuja aplicação foi recusada. O Ministério Público apresentou alegações, tendo formulado as seguintes conclusões: «(…) 88. O Ministério Público interpôs recurso obrigatório, para este Tribunal Constitucional, do teor do douto despacho de fls. 214 a 227 dos presentes autos, proferido pelo Tribunal de Trabalho de Lisboa – 2.º Juízo, 2.ª Secção, “(…) ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 72.º n.º 1 alínea a) e n.º 3 e 70.º n.º 1 alínea a) da Lei 28/82 de 15/11”. 89. O objeto do presente recurso vem identificado nos seguintes termos: “As normas [sobre] cuja inconstitucionalidade se pretende que o Tribunal Constitucional se pronuncie são as seguintes: Artigos 26.º n.º 1 alínea i) , 186.º-K a 186.º-R todos do Código do Processo de Trabalho”. 90. Os parâmetros constitucionais da desconformidade declarada, embora não expressos no requerimento de interposição de recurso, são os invocados na douta sentença recorrida, a saber, o “Princípio Fundamental do Estado de Direito Democrático consagrado no artigo 2.º da CRP, na sua vertente do princípio da segurança jurídica e do princípio da confiança”; o “Princípio Fundamental da Liberdade de Escolha do Género de Trabalho, consagrado no artigo 47.º/1 da CRP.”; e o “Princípio Fundamental da Igualdade, consagrado no artigo 13.º da CRP.”. 91. As conclusões sobre a inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 26.º, n.º 1, alínea i) , e n.º 6; e 186.º-K a 186.º-R, do Código de Processo do Trabalho, alcançadas pelo Mm.º Juiz a quo , fundaram-se num argumentário ideológico de que discordamos e que contestamos, sinteticamente, nos termos que em seguida se discriminam. 92. O Mm.º Juiz a quo , desprezando os potenciais desequilíbrios (e mesmo desigualdades) entre os contra- tantes-patrões e os contratantes-trabalhadores, que constituem a razão de ser do desenvolvimento do direito do trabalho enquanto ramo especial do direito privado, trata o contrato de trabalho como se de um qualquer contrato celebrável entre contraentes colocados no mesmo plano fáctico-jurídico – um contrato do âmbito do direito civil – se tratasse. 93. Desvaloriza, igualmente, o Mm.º Juiz a quo , que, por via da regulamentação laboral estatuída, se propõe o legislador ordinário compatibilizar a liberdade contratual, corolário do princípio da autonomia privada, com o princípio da igualdade nas suas vertentes de proibição do arbítrio e de obrigação de diferenciação.
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=