TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015

177 acórdão n.º 94/15 IX – Nas situações problematizadas na decisão recorrida (os casos em que uma pessoa não quer estar sujeita a nenhuma relação de subordinação jurídica ou em que está vinculada a uma relação jurídica de um específico tipo contratual que não lhe permite ter uma ou outra relação jurídica de natureza laboral), não se verifica um caso de utilização indevida do contrato de prestação de serviço, visto que, nenhuma das partes (e, concretamente, quem presta a outrem determinada atividade remunerada) pretende que a relação jurídica em causa esteja sujeita ao regime laboral, contendo o referido regime suficientes garantias de esta vontade do trabalhador poder ser expressa nos autos e levada em conta, de modo a que tal situação não seja tratada como sendo um caso de trabalho subordinado, pelo que não se afigura que o regime da «ação de reconhecimento de existência de contrato de trabalho» viole a liberdade de escolha de profissão, consagrada no artigo 47.º, n.º 1, da Constituição, concretamente na dimensão em que consagra o direito de escolher o regime de trabalho. X – A «ação de reconhecimento de existência de contrato de trabalho» tem na sua base uma verifica- ção prévia por parte de uma entidade pública (a Autoridade para as Condições de Trabalho), a quem foram atribuídas competências para o efeito, da existência de indícios de uma situação de qualificação fraudulenta (e legalmente proibida) de um determinado contrato como tendo uma natureza diferente de um contrato de trabalho, com o objetivo da subtração da relação em causa ao regime laboral, causando-se com isso prejuízo ao trabalhador e ao Estado; tendo a intervenção do Estado neste âmbito subjacentes diversas razões de interesse público, que levam a que o Estado proceda a um escrutínio (e mesmo à punição) das situações em que se pretenda, de modo fraudu- lento, impedir a aplicação do regime laboral a uma relação jurídica que, substancialmente, tem as características de um contrato de trabalho, estas razões fazem com a que a situação não seja idêntica aos casos em que, pura e simplesmente, surja um litígio entre determinadas pessoas sobre a qualifi- cação de determinada relação jurídica (que, inclusive, poderá até já ter cessado), como contrato de trabalho. XI – Por outro lado, nas situações em que se esteja perante circunstâncias idênticas às que motivaram a aprovação do regime da ação para o reconhecimento de existência de contrato de trabalho, o trabalha- dor que pretenda discutir a qualificação da sua situação não está impedido de, em vez que propor uma ação de processo comum, participar a situação à Autoridade para as Condições de Trabalho que, na sequência dessa queixa, caso verifique que a situação se enquadra nos pressupostos previstos no artigo 15.º-A da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro, dará seguimento à mesma no sentido de ser proposta a competente ação. XII – Em suma, dificilmente se poderá falar numa situação de tratamento desigual de trabalhadores, mas ainda que assim fosse, tal diferença de tratamento (refletida nos diferentes mecanismos processuais colocados à disposição de cada um), não se poderia considerar desrazoável, arbitrária ou destituída de fundamento, de modo a que se pudesse considerar violadora do parâmetro constitucional da igualda- de, pelo que se conclui que as normas cuja aplicação foi recusada não violam também o princípio da igualdade nem qualquer outro parâmetro constitucional.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=