TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
152 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 14 . A segunda posição interpretativa enunciada foi sufragada pela decisão que constituiu acórdão-fun- damento no conflito jurisprudencial dirimido pelo AUJ n.º 8/08, e encontra desenvolvimento em diversas declarações de voto de vencido apostas no referido aresto, nas quais, aliás, se surpreende parte da esteio argumentativo esgrimido em alegações pelo recorrente. Foi primeiramente defendida na doutrina por Faria Costa ( ob. cit. , pp. 278) e encontra a adesão de Lourenço Martins, (in “Droga. Nova Política Legislativa”, in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 11.º, 3.º, julho-setembro de 2001, p. 413; “Comentário”, cit., pp. 227-229). Também dela se afastou o tribunal a quo, por a entender contrária aos critérios gerais de interpretação, assim como por razões constitucional: «Por outro lado, a alegada inconstitucionalidade material por violação do disposto nos artigos 2.º, 3.º, 3, 8.º, 16.º, 18.º e 29.º, 1 e 3 da CRP, bem como a violação das regras de interpretação de normas prevista no artigo 9.º do cód. civil, na sua dimensão normativa ao nível da interpretação do artigo 28.º da Lei n.º 30/2000, também não merece o nosso acolhimento. Com efeito, lançando mão dos preceitos interpretativos da lei geral – o citado artigo. 9.º do cód. civil, com as limitações impostas pelo princípio da legalidade (que em processo penal veda a analogia), – somos de entendi- mento que, com a publicação e entrada em vigor da Lei n.º 30/2000 e a subsequente interpretação do acórdão uni- formizador, não acarreta qualquer inconstitucionalidade material ou formal, sendo certo que o próprio recorrente, na sua motivação não logrou explicitar com clareza onde, em seu entender, residia a inconstitucionalidade material. Como acima referimos, operou-se uma cisão do regime punitivo do consumo de estupefacientes. – Para os casos menos graves um regime punitivo qualitativamente diferente – a contraordenação; – Para as restantes situações a manutenção de uma pena. No entanto, deparamo-nos de novo com a letra da lei, a regra de que, a “interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo (n.º 1) onde se privilegia a interpretação teleológica e de cariz objetivo”. E prossegue o seu n.º 3 que “na fixação do sentido e do alcance da lei, o interprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas (…)” Essa regra servirá para afastar uma solução que a nosso ver é absurda uma vez que a admitir-se, despenalizava todas as situações de detenção de mais de 10 doses diárias para consumo pessoal, ou seja, não cabendo na nova redação da lei – artigo 2.º da Lei 30/2000 – nem no crime de tráfico – artigo 21.º do DL 15/93, punia-se o menos e despenalizava-se o mais grave (…). Quanto a nós, parece-nos que se o legislador quisesse punir, como contraordenação todo o agente que fosse encontrado com produto estupefaciente que destinasse ao seu consumo, não teria limitado a quantidade encon- trada a uma determinada dose diária. Pelo contrario, não teria indicado qualquer limite, deixando ao interprete, perante a análise do circunstancialismo fáctico, a decisão e a escolha de se estar perante um mero ilícito ordena- cional ou um crime. Aliás, a corrente jurisprudencial em que se apoia o entendimento em que se apoia o entendimento plasmado nas motivações do recurso, bem como a respetiva inconstitucionalidade material, defendendo a plena revogação do citado artigo 40.º, n.º 2 do D.L. n.º 15/93, de 22 de janeiro pelo artigo 28.º da Lei 30/2000, de 29.11., passando qualquer detenção de droga para consumo a ser considerada contraordenação, foi sempre minoritária e de fraca expressão (…).» A referência à inadmissibilidade de uma interpretação que puna o menos e despenalize o mais, encontra sintonia com a argumentação que, com fundamento em inconstitucionalidade, conduziu o AUJ n.º 8/08 a recusar fixar jurisprudência de acordo com a orientação do acórdão-fundamento.
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