TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
149 acórdão n.º 79/15 encontrando na proibição da conduta como ilícito de mera ordenação social solução fundada no princípio humanista e na desnecessidade da intervenção criminal: «A estratégia nacional de luta contra a droga opta pela descriminalização do consumo de drogas e pela sua proi- bição como ilícito de mera ordenação social, com a consequente alteração do artigo 40.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro. Essa opção respeita não apenas ao consumo propriamente dito mas também à detenção (posse) e aquisição para esse consumo. Já o cultivo para consumo, porque se alia perigosamente ao tráfico, justifica a manu- tenção de uma sanção de tipo criminal. Na verdade, a criminalização e a consequente mobilização do aparelho judicial devem estar, sobretudo, ao serviço do combate ao tráfico ilícito de drogas e ao branqueamento de capitais. A opção pela descriminalização do consumo de drogas decorre, essencialmente, do princípio humanista, que é um dos princípios estruturantes da presente estratégia e que exige o respeito pelos princípios humanistas fun- damentais do nosso sistema jurídico, nomeadamente os princípios da subsidiariedade ou ultima ratio do direito penal e da proporcionalidade, com os seus corolários que são os subprincípios da necessidade, da adequação e da proibição do excesso. De facto, a criminalização não se justifica por não ser meio absolutamente necessário ou sequer adequado para enfrentar o problema do consumo de drogas e dos seus efeitos, sem dúvida nefastos.» Esta orientação estratégica, que abrange outras vias de intervenção, encontra momento concretizador na Lei n.º 30/2000, de 29 de novembro. A Proposta de Lei n.º 31/VIII, que está na sua origem, louva-se justamente no “cumprimento dos princípios, objetivos gerais e opções estratégicas consagradas na estratégia nacional da luta contra a droga”, propondo-se, “mante[r] o desvalor legal do consumo”, passando “o con- sumo, a aquisição para consumo e a detenção para consumo a constituir ilícitos de ordem contraordenacio- nal”. O cultivo para consumo, por seu turno, mereceu sublinhado na “exposição geral do regime proposto”, constante da referida Proposta, salientando que se mantinha a sua criminalização. Através da Lei n.º 30/2000, o legislador parlamentar deu corpo à opção de criar um novo regime do consumo de estupefacientes (artigo 1.º: “A presente lei tem como objeto a definição do regime jurídico aplicável ao consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas…”), do qual faz parte norma descrimi- nalizadora (artigo 2.º, n.º 1) e bem assim a alteração do âmbito de aplicação do artigo 40.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, por revogação parcial (artigo 28.º). Porém, enquanto à norma do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 30/2000, de 29 de novembro, pode liminarmente ser atribuída a consagração de propósito descriminalizador integral do consumo de estupefacientes, tal como antes jurídico-penalmente tutelado no artigo 40.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro (exceto quanto ao cultivo para consumo próprio de plantas de onde possam ser extraídas substâncias ou preparados estupefacientes), em termos de se alinhar com o programa político-criminal estabelecido na referida Estratégia, o n.º 2 do preceito veio, todavia, por em crise essa conclusão. Diz o preceito: «(…) Artigo 2.º Consumo 1. O consumo, a aquisição e a detenção para consumo próprio de plantas, substâncias ou preparações com- preendidas nas tabelas referidas no artigo anterior constituem contraordenação. 2. Para efeitos da presente lei, a aquisição e a detenção para consumo próprio das substâncias referidas no número anterior não poderão exceder a quantidade necessária para o consumo médio individual durante o período de 10 dias. (…)»
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=