TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015
145 acórdão n.º 79/15 Na verdade, toda essa peça processual é votada a convencer o Tribunal da Relação de que a letra e o espírito da lei impõem interpretação diversa da acolhida na 1.ª instância, ou seja, que o legislador exarou no texto do artigo 28.º da Lei n.º 30/2000 precisamente o que pretendia, culminando com a suscitação de problema de inconstitucionalidade material, por violação dos artigos 2.º, 3.º, n.º 3, 8.º, 16.º, 18.º e 29.º, n. os 1 e 3, da Constituição, reportado à aplicação do “artigo 40.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, com o fundamento do artigo 28.º da Lei n.º 30/2000, de 29 de novembro, manter em vigor o artigo 40.º, n.º 2 do citado diploma legal não só quanto ao cultivo, como relativamente à aquisição, para consumo próprio, de plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a IV, em quantidade superior à necessária para o consumo médio individual durante o período de dez dias”. Pode, a partir desse enunciado, colocar-se em dúvida a sintonia entre a questão colocada à apreciação do Tribunal e o sentido normativo efetivamente aplicado como fundamento jurídico na decisão recorrida. É que deste faz parte, e parte principal para atingir a norma incriminatória efetivamente aplicada como funda- mento jurídico determinante da decisão condenatória numa pena, a conjugação do disposto no artigo 2.º da Lei n.º 30/2000, em particular o seu n.º 2, o qual não é referido nos dois primeiros pontos do requerimento de interposição de recurso. No terceiro ponto, e depois em alegações, é mesmo defendida a sua imprestabi- lidade para a solução do problema normativo em presença. Em resposta a despacho do relator, o recorrente veio contrariar tal interpretação do seu requerimento de interpretação de recurso, dizendo que pretende colocar em questão a admissibilidade da articulação interpre- tativa do disposto nos artigos 1.º e 2.º da Lei n.º 30/2000, de 29 de novembro, com o disposto nos artigos 28.º do mesmo diploma e 40.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, de que foi vertido o sentido normativo aplicado nos autos. Feita tal clarificação, mostram-se reunidos elementos bastantes para considerar que o objeto conferido ao recurso no requerimento de interposição de recurso visa, ao menos implicitamente, sindicar uma norma incriminatória extraída interpretativamente das normas efetivamente conjugadas na decisão recorrida – e não de articulação normativa distinta –, removendo a dúvida a que se fez referência. Temos, então, que a questão de inconstitucionalidade colocada versa norma, extraída interpretativa- mente da conjugação dos artigos 1.º, 2.º, n. os 1 e 2, e 28.º da Lei n.º 30/2000, de 29 de novembro, e 40.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, com o sentido de que se mantém em vigor este último preceito, não só quanto ao cultivo, como relativamente à aquisição e detenção, para consumo próprio, de plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a IV, em quantidade superior à necessária para o consumo médio individual durante o período de dez dias. 8. Assim recortada a questão posta a controlo, cabe defrontar o problema de saber se a conformidade constitucional de um processo interpretativo pelo qual é obtida norma com tais contornos é sindicável pelo Tribunal Constitucional. Já vimos que o recorrente chama à colação, em suporte de uma resposta afirmativa, o decidido no Acórdão n.º 412/03 (acessível, como os demais citados, em www.tribunalconstitucional.pt ) . A questão de saber se o Tribunal Constitucional, em processo de fiscalização concreta, pode sindicar um processo interpretativo seguido pelo julgador na decisão recorrida, alegadamente em violação do princípio da legalidade penal, não tem encontrado entendimento uniforme. No sentido do não conhecimento do recurso com tal objeto, invocando a aplicação de uma norma que ultrapassa o campo semântico comportado pelo texto legal e dirigido a ver censurada a ocorrência de uma interpretação extensiva ou atualista de norma incriminadora, ou de integração analógica in malam partem , defendeu-se que a interpretação normativa obtida através do recurso a um método constitucionalmente ilegítimo não traduz uma verdadeira questão de inconstitucionalidade normativa; integra questão dirigida ao ato de julgamento, visto que o que se questiona não é a norma interpretada em desarmonia com a Cons- tituição, mas sim a decisão que inconstitucionalmente teria aplicado certa norma ao caso concreto através de um método de interpretação colidente com princípios constitucionais. O que está em causa no recurso, nesta
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