TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 92.º Volume \ 2015

101 acórdão n.º 16/15 dos cidadãos na administração da justiça, a aludida recondução não será problemática, desde que, sem pre- juízo desrazoável dos próprios direitos de quem colabora, seja indispensável ou substancialmente importante para um correto exercício da função jurisdicional. Como se refere na decisão recorrida, “só havendo essa cooperação [– a cooperação cívica nas tarefas públicas –] pode o tribunal levar a cabo a administração da justiça que a Constituição lhe impõe com exclusiva sujeição à lei (artigo 203.º da Constituição da República Portuguesa)”. A própria Constituição, no seu artigo 207.º, admite expressamente que a lei estabeleça formas de colaboração dos cidadãos no exercício da função jurisdicional e a ideia de tutela jurisdicional efetiva exige procedimentos judiciais que garantam aos decisores a possibilidade de um conhecimento real e informado sobre a matéria de facto em questão (cfr. o artigo 20.º, n.º 1, da Constituição). Nesse sentido, compreende-se a admissibilidade de detenção por decisão judicial para assegurar a comparência perante autoridade judiciária competente prevista no artigo 27.º, n.º 3, alínea f ) , da Constituição. 6. É, por outro lado, evidente que o grau de sacrifício individualmente imposto a cada perito pela sua colaboração com o tribunal não é sempre o mesmo. A situação dos peritos designados em consequência de relações de trabalho ou de prestação de serviços com estabelecimento, laboratório ou serviço oficial ou com entidades por estes contratadas é diferente da daqueles que são nomeados diretamente pelo juiz, ainda que indicados pelas partes. Do mesmo modo, no universo destes últimos, é necessário distinguir entre os que, por sua iniciativa, integram listas oficiais de elegíveis para nomeação como peritos – é o caso, por exemplo, das listas de peritos avaliadores previstas no Decreto-Lei n.º 125/2002, de 10 de maio, e a que se referem diversos preceitos do Código das Expropriações – e aqueles que, exercendo ou não uma atividade profissional privada, são num dado momento e para um único processo chamados a colaborar com o tribunal. Com efeito, somente nestes casos é que a imposição legal dessa colaboração opera plena e autonomamente. No caso sub iudicio , decorre dos autos e da própria fundamentação da decisão recorrida que é esta última a hipótese considerada. E, para a mesma, vale na íntegra a seguinte afirmação feita no Acórdão n.º 656/14: «(…) Cobrando justificação na prossecução do interesse geral de administração da justiça, este regime de sujeição a que fica vinculado não deixa de impor ao perito um custo pessoal que, como qualquer sacrifício indivi- dualmente imposto, deve ser devidamente compensado.» 7. Na verdade, o Tribunal Constitucional tem vindo a reconhecer um direito geral à reparação ou com- pensação dos danos provenientes de ações e omissões fundado no princípio estruturante do Estado de direito democrático acolhido no artigo 2.º da Constituição (cfr., em especial, o Acórdão n.º 444/08 – que refere um “direito geral à reparação dos danos”; na doutrina, vide Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, 4.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2007, anotação IX ao artigo 22.º, p. 432 – que referem o “princípio da compensação”; Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Por- tuguesa Anotada, tomo I, 2.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2010, anotação IX ao artigo 22.º, pp. 476- 477; e Alves Correia, “A indemnização pelo sacrifício: contributo para o esclarecimento do seu sentido e alcance” in Revista de Legislação e de Jurisprudência, Ano 140 [2011], n.º 3966, pp. 143 e segs., pp. 145-146). Tal «direito geral», ainda que concretizado noutros preceitos constitucionais – por exemplo, nos direitos de indemnização previstos nos artigos 22.º, 37.º, n.º 4, 60.º, n.º 1, e 62.º, n.º 2 –, constitui base normativa suficiente para exigir ao legislador que assegure a respetiva concretização. Com efeito, e como referido, no mencionado Acórdão n.º 444/08: «(…) Constituindo missão do Estado de direito democrático a proteção dos cidadãos contra a prepotência, o arbítrio e a injustiça, não poderá o legislador ordinário deixar de assegurar o direito à reparação dos danos injus- tificados que alguém sofra em consequência da conduta de outrem. A tutela jurídica dos bens e interesses dos cidadãos reconhecidos pela ordem jurídica e que foram injustamente lesionados pela ação ou omissão de outrem,

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