TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
79 acórdão n.º 575/14 já anteriormente reguladas, que por via do novo regime legal passam a ser marcadas por um tratamento desigual. 35. A medida também não resolve qualquer problema no plano da justiça intergeracional, no ponto em que se não apresenta como um modelo de reforma consistente e coerente em que os cidadãos possam confiar. E, além disso, acentua a situação de desigualdade, não apenas no que se refere aos atuais pensionistas, mas também em relação aos atuais contribuintes e futuros beneficiários do sistema de pensões. Basta notar que a contribuição de sustentabilidade surge como uma medida de redução de pensões de caráter definitivo, vindo a incidir também sobre os futuros titulares de pensões sem qualquer ponderação dos efeitos gravosos que as sucessivas modificações do regime de cálculo das pensões e a introdução do fator sustentabilidade – nos termos que foram já anteriormente explanados – implicam já na determinação do montante da pensão e até na determinação da idade de acesso à condição de pensionista. E nesse sentido a contribuição de sustentabilidade é completamente indiferente quer ao esforço con- tributivo dos futuros pensionistas quer à redução que a pensão irá sofrer ab initio em consequência dessa evolução legislativa. 36. Não pode ignorar-se, por outro lado, que o legislador, perante a intensidade da afetação das posi- ções jurídicas dos particulares, tem um especial ónus de fundamentação. Não basta invocar genericamente um objetivo de sustentabilidade do sistema público de pensões. É necessário demonstrar que a medida de redução de pensões, com base na mera aplicação de uma taxa percentual sobre o valor mensal da pensão ou do somatório das pensões de cada titular, é do ponto de vista objetivo um meio idóneo e apto para a apro- ximação ao resultado pretendido e é ainda um meio necessário e exigível, por não existirem outros meios, em princípio, tão eficazes, que pudessem obter o mesmo resultado de forma menos onerosa para as pessoas afetadas. Ora, como vimos, o legislador, no passado recente, adotou já soluções – que, enquadrando verdadeiras reformas estruturais do sistema – estão especialmente vocacionadas para a sustentabilidade do sistema de pensões, quer através da alteração do método de cálculo das pensões, quer por via da introdução do fator de sustentabilidade, como mecanismo de ajustamento automático do valor das pensões e das próprias condições de atribuição da pensão à evolução da longevidade. A mera redução do valor da pensão por aplicação de uma taxa percentual, à semelhança do que sucedeu com a antiga CES, não tem senão um efeito orçamental de diminuição de despesa a curto prazo sem qualquer capacidade de adaptação a modificações que, no futuro, resultem de alterações demográficas ou económicas. E a que o legislador apenas poderá responder, no futuro, na ausência de uma verdadeira reforma estrutural, por via de novas medidas conjunturais de agravamento da taxa ou de alargamento do universo dos destinatários afetados. Nestas circunstâncias, o interesse da sustentabilidade do sistema público de pensões, realizado através de uma mera medida de redução do valor da pensão, sem qualquer ponderação de outros fatores que seriam relevantes para mitigar a lesão das posições jurídicas subjetivas dos pensionistas – mormente no plano da igualdade e equidade interna e da justiça intrageracional e intergeracional –, e desacompanhado também de uma suficiente justificação que possa esbater as dúvidas quanto à adequação e necessidade da medida, não pode ser tido como um interesse público prevalecente face à intensidade do sacrifício que é imposto aos particulares. Em suma, a contribuição de sustentabilidade, tal como se encontra gizada nos artigos 2.º e 4.º do Decreto n.º 262/XII, é uma medida que afeta desproporcionadamente o princípio constitucional da prote- ção da confiança ínsito no princípio do Estado de direito democrático plasmado no artigo 2.º da Constitui- ção da República Portuguesa.
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=