TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

697 acórdão n.º 560/14 Os princípios que orientam em geral toda a ação punitiva do Estado são, por certo, relevantes para a apre- ciação da questão normativa de constitucionalidade em apreço, enquanto opções político-criminais funda- mentais (cfr. Acórdão n.º 698/09), mas deles não resulta valor paramétrico preciso, suscetível por si só de fundar juízo de desconformidade com a Constituição da solução normativa contida no artigo 196.º, n. os 1 e 2, do CEP. Por seu turno, as tarefas fundamentais do Estado, prescritas no artigo 9.º da Constituição, mormente a garantia dos direitos e liberdades fundamentais e o respeito pelo princípio do Estado de direito democrático, constante da alínea b) do preceito, coincidem, no plano em que são convocados, com os concretos direitos, liberdades e garantias que se tenham por afetados e o princípio do Estado de direito democrático consagrado no artigo 2.º da Constituição. Por outro lado, a invocação do disposto na alínea d) do mesmo artigo 9.º, na parte em que consagra como tarefa fundamental do Estado a promoção da igualdade real dos portugueses, encontra conexão com a invocação de infração do princípio da igualdade, constante do artigo 13.º da Cons- tituição, na ótica dos diferentes poderes dos sujeitos da relação jurídico-processual da execução das penas privativas da liberdade. O mesmo acontece, na perspetiva da proibição da discriminação compreendida no âmbito de proteção do preceito, com a paralela invocação do princípio da universalidade constante do artigo 12.º da Constituição, de acordo com o qual todos os cidadãos gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres consignados na Constituição. Em todo o caso, a argumentação que conduz o recorrente à afirmação da violação de tais princípios constitucionais toma como boa premissa que vimos já não ser correta. O recluso não beneficia de um direito generalizado ao recurso, nem a norma questionada respeita a decisão judicial que comporte direta restrição do direito à liberdade, dela não resultando restrição jusfundamental relativamente à qual caiba apreciar a sua conformidade com o princípio da proporcionalidade (artigo 18.º, n.º 2, da Constituição). Então, a análise a que resta proceder versa a conformidade da norma colocada a exame com o princípio da igualdade, constante do artigo 13.º da Constituição. 18. O princípio da igualdade, enquanto parâmetro constitucional capaz de limitar as ações do legislador, comporta reconhecidamente várias dimensões: proibição do arbítrio legislativo; proibição de discriminações negativas, não fundadas, entre os sujeitos; assim como eventual imposição de descriminações positivas, com projeções distintas tendo em conta as especificidades do âmbito material em causa. Da jurisprudência cons- titucional resulta que o princípio não proíbe em absoluto toda e qualquer diferenciação de tratamento, mas apenas as diferenciações (e a sua medida) materialmente infundadas, sem qualquer fundamento razoável ou sem qualquer justificação objetiva e racional. O recorrente invoca aqui a vertente da igualdade de armas, que a doutrina e a jurisprudência foram retirando do artigo 6.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, e que ganha expressão no artigo 20.º, n.º 4, da Constituição, por via da densificação do princípio do processo equitativo (assim, Gomes Canotilho/Vital Moreira, ob. cit. , pp. 415-416). Cabe assinalar que o princípio da igualdade de armas tem sido amiúde equacionado no âmbito criminal na sua relação com o artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, e a consagração do direito ao recurso como uma das garantias de defesa do arguido em processo penal. Assim aconteceu, tomando uma das decisões mais recentes, no Acórdão n.º 540/12, em que se julgou inconstitucional norma do Código de Processo Penal que admitia o recurso de assistente de decisão absolutória proferida em recurso quando a decisão condenatória não permitia recurso do arguido, a partir do seguinte entendimento: «O princípio da igualdade no âmbito do processo criminal tem de ser perspetivado em consonância com a específica natureza de um processo que assegura ao arguido todas as garantias de defesa, “podendo significar aí, não que os sujeitos do processo devam ter estatutos processuais absolutamente idênticos e paritários, simetricamente decalcados, mas essencialmente que o arguido poderá, por vezes, beneficiar de um estatuto fortemente «privile- giado», como forma de compensar uma presumida fragilidade ou maior debilidade relativamente à acusação, no

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