TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

696 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL pp. 50-52, nota 145), a que se junta a circunstância de, podendo ter lugar em momentos mais próximos do cometimento do crime, as ponderações inscritas no domínio das finalidades de prevenção geral da pena assumirem maior intensidade. Temos então que o cotejo que vimos de fazer permite concluir que a normação relativa à licença de saída jurisdicional não reveste as características de regulamentação diretamente atinente à realização concreta da reação criminal, que encontre inscrição nas garantias de defesa em processo criminal asseguradas pela Cons- tituição (artigo 32.º, n.º 1, da Constituição). 16. Aqui chegados, importa dizer que o afastamento do parâmetro do artigo 32.º, n.º 1, da Consti- tuição, não significa que fique removida a possibilidade de se reconhecer a presença de vinculação consti- tucional na concretização pelo legislador do direito ao recurso, como, na perspetiva inversa, da pretendida inscrição do recurso no elenco das garantias de defesa em processo criminal não decorreria, como sustenta o recorrente, a necessária abertura da via de impugnação recursória relativamente a todas as decisões proferidas contra o visado pela ação punitiva do Estado. Conforme o Tribunal tem afirmado reiteradamente, o direito ao recurso expressamente consignado no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, entre as garantias de defesa do arguido, não exige a possibilidade de impugnação de toda e qualquer decisão proferida ao longo do processo, impondo apenas que necessa- riamente se assegure um segundo grau de jurisdição relativamente às decisões condenatórias e àquelas que afetem direitos fundamentais do arguido, designadamente a sua liberdade (vide, entre muitos, os Acórdãos n. os  265/94, 387/99, 430/10, 153/12 e 848/13, este com proximidade com o problema em análise). Ora, sempre seria de entender que a decisão de não concessão de licença de saída, que aqui se discute, não atinge diretamente o direito à liberdade, pois a sua restrição resulta do título judiciário de execução ínsito na decisão condenatória transitada em julgado e, em todo o caso, como se viu, não altera substancialmente o estatuto do recluso. Esta asserção comporta igualmente resposta à questão do direito ao recurso por parte do recluso quanto a tais decisões, perante os parâmetros de controlo do direito à liberdade (artigo 27.º, n.º 1) e do direito de acesso ao direito e aos tribunais (artigo 20.º, n.º 1), os quais, aliás, o recorrente não aponta expressamente como violados no requerimento de interposição de recurso (cfr. supra ponto 3) ou em alegações (cfr. supra ponto 4, 86.º e 87.º). Aqui, tal como aconteceu no caso decidido pelo Acórdão n.º 150/13, o recluso viu assegurado o acesso ao direito e aos tribunais em virtude da decisão proferida ter natureza judicial, emitida pelo juiz do Tribunal de Execução das Penas, mantendo-se na sua essência inalterado o modo de cumpri- mento da pena privativa da liberdade, ínsita na condenação, e as restrições jusfundamentais inerentes ao seu sentido e às exigências próprias da sua execução (artigo 30.º, n.º 5, da Constituição), qualquer que seja o sentido da decisão em matéria de licença de saída jurisdicional. Em suma, não se encontra na decisão judicial denegatória da sua saída por um período de dias do esta- belecimento prisional em que o condenado se encontre a cumprir reação criminal privativa da liberdade, cujo recurso é regulado pela normação questionada, afetação do bem jurídico essencial que é o direito à liberdade, em termos de fundar a imposição constitucional do direito ao recurso por parte do recluso. 17. O recorrente indicou no seu requerimento de interposição de recurso como violados, para além do artigo 32.º, n.º 1 da Constituição – que já vimos não ser aqui convocável – os princípios da igualdade, proporcionalidade, não discriminação e dos fins das penas. Em alegações, afirma a violação do disposto nos artigos 9.º, alíneas b) e d) , 12.º, n.º 1, 13.º, n. os 1 e 2, 18.º, n. os 1 e 2 e, novamente, o 32.º, n.º 1, todos da Constituição, para além dos princípios da sociabilidade e “o dever de ajuda que incumbe ao Estado perante os seus cidadãos”, os quais, porém, não reconduz a qualquer preceito constitucional. Importa considerar que a questão normativa colocada versa problema atinente ao direito ao recurso, cingindo-se ao plano adjetivo e, dentre este, aos meios de impugnação para o Tribunal da Relação conferi- dos ao recluso de decisões do juiz do Tribunal de Execução das Penas sobre licença de saída jurisdicional.

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