TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
689 acórdão n.º 560/14 Na síntese formulada por Maria João Antunes, a sua edição obedece a três vetores político-criminais fundamentais em matéria de execução da pena de prisão: «Primeira: a execução desta pena privativa da liberdade deve ser jurisdicionalizada, tendo sido dado o primeiro passo pela Lei n.º 2000, de 16 de maio de 1944, e pelo Decreto n.º 34553, de 30 de abril de 1945, deferindo aos tribunais de execução das penas as “decisões destinadas a modificar ou substituir as penas ou as medidas de segurança” (n.º 1 da Base I daquela Lei). O que abriu a questão de saber o que é que deve estar, incluído na reserva de juiz, devendo ser consequentemente subtraído da competência da administração prisional (cfr. Acórdão n.º 427/09). Segunda: a execução da pena de prisão deve estar orientada para a socialização do condenado, prosseguindo o Estado a tarefa que lhe está constitucionalmente cometida de proporcionar ao condenado as condições necessárias para que conduza a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes, devendo a socialização obede- cer a uma dinâmica progressiva de preparação para a liberdade. Por exemplo, através de medidas de flexibilização da execução da pena de prisão (artigo 14.º do CE – regime aberto no exterior; artigo 76.º do CE – licenças de saída do estabelecimento prisional) ou mediante a concessão da liberdade condicional (artigo 61.º, 63.º e 64.º do CP). Terceira: a privação da liberdade deve ser a ultima ratio da política criminal, enquanto decorrência do princípio constitucional da proporcionalidade das restrições dos direitos, devendo ser assegurada a passagem do recluso para regimes de execução cada vez menos restritivos da liberdade. Por exemplo, através de medidas de flexibilização da execução da pena de prisão (artigo 14.º do CE – regime aberto no interior e no exterior), mediante a concessão da liberdade condicional (artigos 61.º, 63.º e 64.º do CP) ou por via de formas diversificadas de execução desta sanção privativa da liberdade [artigo 44.º, n. os 1, alínea b) , e 2, do CP] – regime de permanência da habitação; artigo 118.º e segs. do CE – modificação da execução da pena de prisão; artigo 62.º do CP – adaptação à liberdade condicional)» ( As Consequências Jurídicas do Crime, Coimbra Editora, 2013, p. 80-81).» 11. A Lei n.º 115/2009, de 12 de outubro, tem na sua origem a Proposta de Lei n.º 252/X. Na respe- tiva exposição de motivos encontra-se apenas uma referência às licenças de saída, sinalizando o reforço das garantias do recluso resultantes do alargamento do leque de decisões que o recluso pode impugnar perante o Tribunal de Execução das Penas, de modo a incluir a revogação de licença de saída administrativa. O artigo 196.º do CEP, no qual o recorrente aloja o sentido normativo impugnado, integra a única disposição da secção III, dedicada aos recursos, no âmbito do capítulo VI, relativo ao processo de apreciação da licença de saída jurisdicional, figura que sucedeu à anterior saída precária prolongada. Em prossecução do princípio orientador da (res)socialização do recluso e de concretização da sua pro- gressiva aproximação à vida livre (artigo 5.º, n.º 2), o legislador do CEP acolheu a possibilidade de serem concedidas ao recluso licenças de saída do estabelecimento prisional. De acordo com o artigo 76.º, tais licenças dependem, em qualquer caso, do consentimento do recluso, e respeitam duas tipologias distintas, assentando o critério diferenciador na natureza da entidade concedente: licenças de saída jurisdicionais e licenças de saída administrativas. As licenças de saída jurisdicionais – que relevam para a questão em apreço – visam “a manutenção e promoção dos laços familiares e sociais e a preparação para a vida em liberdade” (artigo 76.º, n.º 2), escopo que, todavia, não lhes é exclusivo; pode fundar igualmente a concessão de licenças de saída administrativas de curta duração [artigo 76.º, n.º 3, alínea a), e 80.º] e de preparação para a liberdade no período final de cumprimento da pena [artigos 76.º, n.º 3, alínea d), e 83.º]. Todas dependem da verificação cumulativa de um conjunto de pressupostos materiais, enunciados no artigo 78.º: fundada expetativa de que o recluso se comportará de modo socialmente responsável, sem cometer crimes; compatibilidade da saída com a defesa da ordem e da paz social; fundada expetativa de que o recluso não se subtrairá à execução da pena ou medida de segurança. A que se juntam, como fatores de ponderação, a evolução da execução da pena, o ambiente social ou familiar e antecedentes da vida do recluso, as circunstâncias do caso e também a especial vulnerabi- lidade e as exigências de proteção da vitima da conduta.
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