TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

686 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Este último pressuposto mais não é do que a manifestação do caráter instrumental dos recursos de fis- calização concreta. De facto, quando a norma impugnada não tenha constituído determinante do julgado, ou caso a decisão recorrida haja assentado em fundamento alternativo, não pode este Tribunal tomar conhe- cimento do objeto do recurso, por ausência de interesse processual, já que, qualquer que seja o juízo formu- lado pelo Tribunal Constitucional sobre a questão jurídico-constitucional, a decisão impugnada mantém-se inelutavelmente incólume. No caso em apreço, o recorrente suscitou, em sede de reclamação da decisão que não lhe admitiu recurso, perante o tribunal a quo, primeiro uma questão de desconformidade constitucional que versou o disposto no artigo 196.º, n. os 1 e 2, do CEP, enquanto “clara violação do princípio da igualdade de armas e da proporcionalidade em processo penal”, nestes termos: «(…) 11.º Viola ou não a Constituição, o facto do Ministério Público ter mais poderes que o arguido recluso, em prejuízo deste (art. 196.º, n.º 1 do CEP), pois só o MP tem direito ao recurso, sendo este direito vedado ao arguido, em contradição com o estatuído na Constituição – artigo 32.º, n.º 1 da CRP, por não estar expressamente previsto no n.º 2 do artigo 196.º do CEP?» Mais adiante no mesmo requerimento, surge enunciada uma segunda questão, dirigida a dimensão normativa reportada igualmente ao artigo 196.º, aí na sua conjugação com o artigo 235.º, e que não se atém na contraposição dos poderes em matéria de recurso entre o recluso e do Ministério Público. Entendeu o reclamante, ora recorrente, que a Constituição garante ao recluso o direito a recorrer da decisão que o preju- dique, por estar em causa, em matéria de concessão de saídas jurisdicionais, o seu direito à liberdade, o que implicaria a invalidação, por desconforme com o disposto nos artigos 2.º, 9.º, 18.º e 32.º da Lei Fundamen- tal, da limitação ao recurso da decisão negativa sobre o pedido de licença de saída jurisdicional, decorrente dos artigos 196.º e 235.º do CEP. A decisão recorrida centrou a sua abordagem nesta segunda questão, incidente sobre a “solução normativa resultante dos artigos 196.º e 235.º do CEP”, na perspetiva, mais ampla, do sistema de recursos no âmbito da execução de penas privativas de liberdade, vindo a concluir pela ausência de violação dos artigos 18.º e 32.º, n.º 1, da Constituição, no impedimento ao recurso do condenado operada por tais preceitos do CEP. No que concerne à primeira dimensão colocada, em que se tomam aos “poderes” acrescidos do Minis- tério Público no domínio do recurso e os princípios da igualdade (de armas) e da proporcionalidade (na restrição do direito ao recurso), o tribunal a quo teve em atenção tão somente a possibilidade de recurso do Ministério Público em favor do arguido, que considerou não violar o princípio da proporcionalidade. No requerimento de interposição de recurso para este Tribunal – peça processual em que, como reite- radamente sublinhado por este Tribunal, o requerente conforma o objeto do recurso, sendo-lhe permitido reduzi-lo, mas não ampliá-lo, em alegações –, a questão normativa colocada a controlo é reportada a sentido normativo extraído unicamente dos n. os 1 e 2 do artigo 196.º do CEP, e em dimensão que encontra identi- dade com a primeira questão normativa de constitucionalidade suscitada perante o tribunal a quo . Na verdade, quando o recorrente inscreve na questão o “facto do Ministério Público ter mais poderes que o arguido recluso, em prejuízo deste”, circunscreve o problema de constitucionalidade à paridade (de armas) no plano do recurso entre os sujeitos processuais da execução das penas, sem nele abranger, a título principal, a interrogação sobre se a Constituição impõe ao legislador a consagração do direito do recluso de recorrer da decisão judicial que negue satisfação ao pedido de concessão de licença de saída jurisdicional. Releva para esta conclusão a ausência de referência à norma do artigo 235.º do CEP, mormente ao seu n.º 1, em que se prescreve que “Das decisões do tribunal de execução das penas cabe recurso para a Relação nos casos expressamente previstos na lei”, norma expressamente convocada pelo recorrente como objeto da segunda questão de constitucionalidade suscitada perante o tribunal a quo e por este aplicada para confirmar a decisão de não admissão do recurso.

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