TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

650 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Em 14 de Janeiro de 2011, a recorrente requereu ao Procurador-Geral Distrital de Coimbra a suspensão do trabalho nos turnos marcados para as comarcas de Celorico da Beira e Fornos de Algodres e a sua com- pensação por serviço urgente que não coincida com o dia de sábado ou que deva ser prestado em períodos de férias judiciais. E formulou idêntico requerimento em 15 de abril de 2011, após ter sido transferida para a comarca da Covilhã, relativamente a serviço de turno a efetuar nessa comarca. Esses pedidos foram indeferidos, respectivamente, pelas deliberações do Conselho Superior do Ministé- rio Público de 8 de abril e 11 de outubro de 2011. Na sequência, a recorrente intentou no Supremo Tribunal Administrativo a presente a ação adminis- trativa especial destinada a obter a condenação do Conselho Superior do Ministério Público a dispensá-la, por motivos religiosos, da realização dos turnos de serviço urgente que coincidissem com os dias de sábado. A ação foi julgada improcedente por acórdão do STA de 6 de dezembro de 2012, tirado em subsecção, e cujo julgamento foi confirmado, em sede de recurso jurisdicional, pelo acórdão de 12 de novembro de 2013 do Pleno da Secção, argumentando-se, no plano do direito constitucional, e em síntese, que o trabalho dos magistrados do Ministério Público nos sábados que estejam de turno não se processa em regime de fle- xibilidade de horário para efeitos do disposto no artigo 14.º, n.º 1, alínea a) , da Lei da Liberdade Religiosa. É desta decisão que vem interposto o presente recurso de constitucionalidade, alegando-se que a norma do artigo 14.º, n.º 1, alínea a) , da Lei da Liberdade Religiosa, aprovada pela Lei n.º 16/2001, de 22 de Junho, quando interpretada no sentido de que a suspensão do trabalho no dia descanso semanal prescrito pela confissão que professa se verifica apenas em relação a trabalhadores em regime de horário flexível é inconstitucional por violação da liberdade de religião e da liberdade de escolha de profissão respectivamente consagradas nos artigos 41.º e 47.º, n.º 1, da Constituição. 4. O artigo 41.º da CRP, sob a epígrafe liberdade de consciência, de religião e de culto, dispõe o seguinte: «1 – A liberdade de consciência, de religião e de culto é inviolável. 2 – Ninguém pode ser perseguido, privado de direitos ou isento de obrigações ou deveres cívicos por causa das suas convicções ou prática religiosa. 3 – Ninguém pode ser perguntado por qualquer autoridade acerca das suas convicções ou prática religiosa, salvo para recolha de dados estatísticos não individualmente identificáveis, nem ser prejudicado por se recusar a responder. 4 – As igrejas e outras comunidades religiosas estão separadas do Estado e são livres na sua organização e no exercício das suas funções e do culto. 5 – É garantida a liberdade de ensino de qualquer religião praticada no âmbito da respectiva confissão, bem como a utilização de meios de comunicação social próprios para o prosseguimento das suas atividades. 6 – É garantido o direito à objeção de consciência, nos termos da Lei.» Como vem sendo reconhecido, o preceito consagra três direitos distintos mas entre si conexos: a liber- dade de consciência, traduzida essencialmente na faculdade de escolher os próprios padrões de valoração ética e moral de conduta; a liberdade de religião, como sendo a liberdade de adotar ou não uma religião, de escolher uma determinada religião, de fazer proselitismo num sentido ou noutro, de não ser prejudicado por qualquer posição ou atitude religiosa ou anti-religiosa; a liberdade de culto, como uma dimensão da liber- dade religiosa dos crentes, compreendendo o direito individual ou colectivo de praticar os actos externos de veneração próprios de uma determinada religião. A liberdade de consciência – indissociável da liberdade de pensamento – é mais ampla do que a liber- dade de religião, pois tem por objecto tanto as crenças religiosas como quaisquer convicções morais e filosó- ficas. Em contrapartida, ela só diz respeito ao foro individual, ao passo que a liberdade de religião possui uma necessária dimensão colectiva e institucional e implica também a liberdade das confissões religiosas.

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