TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

645 acórdão n.º 545/14 os Magistrados do MP que professem uma religião minoritária, cujo dia santo não coincida com o dia de descanso semanal, sempre poderão exercer o mesmo direito que a recorrente. VV) Por outro lado, com o pedido de dispensa, a recorrente nunca pretendeu obter uma redução de trabalho em relação aos seus Colegas, pelo contrário, a recorrente apresentou uma alternativa válida, tendo requerido que os turnos de sábado a que estava adstrita fossem compensados por turnos a realizar noutros dias (que não coincidissem com o sábado, claro). WW) No seguimento do exposto, conclui-se que a alínea a) do n.º 1 do artigo 14.º da LLR, quando interpretada no sentido de que a dispensa de trabalho por motivos religiosos apenas se verifica em relação aos trabalha- dores em regime de horário flexível – como interpretou o CSMP e, depois, o STA – padece de inconstitu- cionalidade, por violar o artigo 13.º da CRP. XX) Por fim, nos termos do disposto no artigo 47.º, n.º 1 da CRP, que consagra a liberdade de escolha de pro- fissão, “todos têm o direito de escolher livremente a profissão ou o género de trabalho, salvas as restrições legais impostas pelo interesse coletivo ou inerentes à sua própria capacidade”, estabelecendo o n.º 2 do mesmo preceito constitucional que “todos os cidadãos têm o direito de acesso à função pública, em condi- ções de igualdade e liberdade, em regra por via de concurso.” YY) Descendo ao caso dos autos, ao impedir que a recorrente obtenha a dispensa de prestar trabalho secular nos turnos realizados ao sábado, o Recorrido e o Tribunal estão também a restringir de forma inadmissível o exercício do direito à liberdade de escolha de profissão (artigo 47.º da CRP), pois colocam a recorrente entre a «espada e a parede». Com efeito, a recorrente vê-se confrontada com a inconstitucional, ilegal e injusta, escolha entre a religião que professa e a profissão que exerce: se prestar trabalho ao sábado, desres- peita as suas crenças religiosas; se se recusar a trabalhar, sem ter a devida autorização do CSMP, está a violar os seus deveres profissionais. ZZ) É certo que ninguém impediu expressamente a recorrente de ser Magistrada do MP, por força da sua reli- gião! No entanto, para o STA, a escolha da profissão exercida pela recorrente implica a aceitação e cumpri- mento de todas as obrigações inerentes a esse ofício, fazendo equivaler ao significado de deveres/obrigações a impossibilidade de exercício de outros direitos, liberdades e garantias, sem que se verifiquem todos os pressupostos para a sua restrição, sem se seguir o princípio de conciliação e harmonização de direitos, liber- dades e garantias em caso de conflito. AAA) Note-se que a recorrente é testemunha da possibilidade de compatibilização e harmonização dos direitos em causa uma vez que, quando fez os exames de admissão ao CEJ, requereu autorização para realizar os mesmos noutro dia que não ao sábado, o que lhe foi concedido; já durante o período de formação no CEJ, quando solicitou a antecipação de aulas que terminavam depois do pôr do sol de sexta-feira, tal pedido foi atendido favoravelmente com alteração do horário à sexta-feira; tudo sempre em virtude do respeito pela liberdade religiosa invocada pela recorrente. BBB) Mais, ao longo do exercício das funções de Magistrada, quando os Colegas ficam a saber que é Adventista do Sétimo Dia e que reserva o dia de sábado como dia santo, prontificam-se sempre para a substituir nos sábados em que esteja de turno. CCC) Ou seja, a recorrente nunca escondeu, quer na candidatura ao CEJ, quer durante o respetivo período de formação (quer durante o exercício da sua profissão), que é Adventista do Sétimo Dia e que reservava o dia de sábado como dia santo, situação que também foi sendo respeitada pelas várias instituições com que foi lidando ao longo da sua formação (destacando-se, para além do CEJ, a Ordem dos Advogados e a Facul- dade de Direito da Universidade do Porto). DDD) Neste seguimento, deparando-se a recorrente com várias entidades que, ao longo da sua vida académica e de formação profissional, foram respeitando a sua liberdade de religião e de culto, sendo por isso testemunha, no seu caso concreto, da possibilidade de harmonização e conciliação prática dessa liberdade com a liberdade de escolha e exercício de profissão, não pensou que fosse possível o CSMP se recusar a admitir a harmoniza- ção/conciliação das referidas liberdades, com a agravante de ver essa posição confirmada pelo STA.

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