TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
643 acórdão n.º 545/14 fazerem a sua meditação e reflexão plenas –, como igualmente no que se refere à dimensão coletiva e insti- tucional da liberdade de religião e de culto, a mesma reserva para um determinado dia semanal a celebração de cerimónias religiosas e a participação ativa dos seus fiéis na Igreja e na comunidade. É precisamente esse o caso da Igreja Adventista do Sétimo Dia. CC) Na verdade, para esta Igreja, a liberdade de religião e de culto passa necessariamente pelo respeito pelos princípios fundamentais da sua religião, entre as quais consta a crença 20.ª que, na sequência do texto bíblico, prescreve o sábado como um dia de descanso, de adoração e de ministério em harmonia com os ensinamentos de Jesus, o Senhor do sábado. Um entendimento diferente, aniquila, por completo, o exer- cício pleno da sua fé. DD) Assim, ao contrário do que parece defender o STA, o problema não reside na quantidade de horas de trabalho, mas em ter de trabalhar ao sábado visto que a crença da recorrente e da Igreja Adventista é a de que ao sábado não se pode, de todo, trabalhar. O sábado é o dia para “parar” e agradecer a Deus por tudo o que somos e temos, refletindo sobre os pensamentos e as atitudes de toda a semana. Aquele que trabalha no sábado está a ofender a sua consciência por não estar a respeitar a Deus, os seus pares e a igreja, ou seja, está a pecar porque se está a separar de Deus! EE) Acresce que os turnos ao sábado têm uma duração de 24 horas (e não de apenas um terço do dia, como o STA erradamente defendeu!), com início às 00:00h do sábado e fim às 23:59h desse mesmo dia, depen- dendo o número de horas efetivas despendidas a trabalhar dos contornos e da complexidade das situações urgentes que surgirem. É certo que estas situações são alvo de tratamento preferencial nos serviços, entre as 09:00h e as 12:30h de sábado, porém, não raras as vezes, existe a necessidade de estender o trabalho para a tarde de sábado. Assim, no limite, o dever profissional da recorrente impõe-lhe que trabalhe todas as horas do turno de sábado! FF) Por outro lado, existe sobreposição entre as horas de trabalho que a recorrente, por regra, tem de prestar no turno de sábado (repita-se, das 09:00h às 12:30h) e as horas de culto, que são, invariavelmente, no período da manhã, entre as 10:00h e as 12:00h (Documento de fls. 121 a 125 junto ao processo 1078/11). GG) Também não colhe aqui o argumento, usado pelo STA, de que a recorrente não explicou conveniente- mente a importância do dia de sábado e a relevância do culto para si e para a sua religião, pois o essencial foi julgado provado pelo próprio Tribunalínea Veja-se, a este propósito, os factos provados constantes das alíneas i) , k) , l) , m) , o) e p) . HH) Com efeito, tendo considerado provado que «para manter o sábado como dia Sagrado, os adventistas devem abster-se de todo o trabalho secular», não podia depois o Tribunal afirmar, paradoxalmente, que «não vem alegado que a Autora tenha de reservar todas as horas dos dias de sábado ao cumprimento dos seus deveres religiosos», e decidir que «o ato impugnado não impede a Autora de cumprir os seus deveres religiosos nos dias de turno a realizar aos sábados, visto o trabalho exigido nesses dias preencher menos de um terço das suas 24 horas». A crença religiosa de não prestação de trabalho secular não contempla exceções! II) A condição prescrita na alínea a) do n.º 1 do artigo 14.º da LLR não procede a uma efetiva compatibiliza- ção de direitos. Se o fizesse certamente alargaria a possibilidade de obter dispensa de trabalho, por motivos religiosos, a pessoas com diferentes tipos de horários (e até com isenção, como é o caso da recorrente). Isto porque a compensação integral do respetivo período de trabalho não é uma faculdade só de quem tem um horário flexível. Por exemplo, quem tem isenção de horário pode prestar trabalho em momento diferente do inicialmente previsto, desde que atinja os resultados pretendidos, e quem trabalha por turnos pode compensar as horas no turno seguinte. JJ) No caso específico da recorrente, se a sua pretensão fosse deferida, e ela fosse dispensada de prestar trabalho ao sábado, não haveria nenhum risco para o interesse público de acautelar situações urgentes e de garantir o normal funcionamento das secretarias judiciais, nem para o direito ao descanso dos restantes Procuradores. Isto porque os turnos aos sábados não iriam acabar, mas seriam realizados por outros Colegas da recorrente, que iriam ser depois compensados com menos turnos em dias feriados e em dias de turno em férias judiciais não coincidentes com o sábado, por sua vez, assegurados pela recorrente. Efetivamente, a recorrente não
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