TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

618 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Também a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia consagra a liberdade religiosa como direito fundamental de todas as pessoas (que não apenas os cidadãos europeus): «(…) Artigo 10.º Liberdade de pensamento, de consciência e de religião 1. Todas as pessoas têm direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião. Este direito implica a liberdade de mudar de religião ou de convicção, bem como a liberdade de manifestar a sua religião ou a sua convicção, individual ou coletivamente, em público ou em privado, através do culto, do ensino, de práticas e da celebração de ritos. 2. O direito à objeção de consciência é reconhecido pelas legislações nacionais que regem o respetivo exercício.» 7. Partamos do artigo 41.º da Constituição da República Portuguesa (sob a epígrafe «Liberdade de cons- ciência, de religião e de culto»), o qual garante a liberdade de consciência, religião e culto, enquanto direito fundamental. É que a invocação da ofensa à liberdade de religião – alegadamente operada neste caso pelo disposto no artigo 14.º, n.º 1, da Lei da Liberdade Religiosa – coloca o juiz constitucional perante um dos núcleos mais relevantes dos direitos fundamentais, desde logo resultante da sua expressiva valoração constitucional no artigo 41.º da Lei Fundamental como direito inviolável (adjetivo que, como assinalam Jorge Miranda e Pedro Garcia Marques, na anotação ao artigo 41.º da Constituição, in Jorge Miranda/Rui Medeiros, Consti- tuição Portuguesa Anotada, Tomo I, 2.ª edição, Wolters Kluwer Portugal/Coimbra Editora, Coimbra, 2010, p. 893, «apenas se encontra também no artigo 24.º sobre o direito à vida e no artigo 25.º sobre a integridade física e moral»). Colocada a par da liberdade de consciência e da liberdade de culto (cfr. artigo 41.º, n.º 1, da CRP), a liberdade de religião forma com a primeira um núcleo de direitos pessoais garantidos pela Constituição, mesmo em caso de estado de exceção constitucional (artigo 19.º, n.º 6). Para além dos elementos confluentes entre as três liberdades, pode autonomizar-se a liberdade que nos ocupa. Escrevem Jorge Miranda e Pedro Garcia Marques (ainda na anotação ao artigo 41.º da Constituição, in Jorge Miranda/Rui Medeiros, Cons- tituição Portuguesa Anotada, cit., loc. cit. ) que «conquanto seja direito ou complexo de direitos que possa, de certo prisma, configurar-se unitariamente, importa deslindar. A liberdade de consciência – indissociável da liberdade de pensamento – é a liberdade de formar a consciência, de decidir em consciência e de agir em consciência. E revela-se mais ampla do que a liberdade de religião, pois tem por objeto tanto as crenças religiosas como quaisquer convicções morais e filosóficas. Em contrapartida, ela só diz respeito ao foro individual, ao passo que a liberdade de religião possui uma forte dimensão coletiva e institucional, traduzida na liberdade das confissões religiosas. Quanto à liberdade de culto, não é senão uma das componentes da liberdade de religião.». De todo o modo, a invocação de imperativos religiosos para a determinação da conduta do crente nas suas obrigações laborais não deixa de convocar as várias liberdades tuteladas pelo artigo 41.º da Constituição. Com efeito, estamos perante direitos conexos, como assinala a doutrina: «(…) este preceito reconhece não um mas três direitos distintos, embora conexos, já que o segundo é uma especificação do primeiro, sendo o terceiro uma especificação do segundo.» (Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portu- guesa Anotada, Volume I, cit., p. 609). Assim, a jusante, a liberdade de culto, de participação individual ou coletiva em atos cultuais, como as liturgias, a oração ou a meditação, religiosamente motivada, no período temporal determinado pela religião professada. Corresponderá a final ao próprio exercício da liberdade religiosa, no sentido de «liberdade de praticar as cerimónias e ritos da religião, tanto em público como em privado» (Raquel Tavares dos Reis ,

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