TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

612 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL “1 – Os funcionários e agentes do estado e demais entidades públicas, bem como os trabalhadores em regime de contrato de trabalho, têm o direito de, a seu pedido, suspender o trabalho no dia de des- canso semanal, nos dias de festividade e nos períodos horários que lhes sejam prescritos pela confissão que professam, nas seguintes condições: a) Trabalharem em regime de flexibilidade de horário; b) Serem membros de igreja ou comunidade religiosa inscrita que enviou no ano anterior ao membro do Governo competente em razão da matéria a indicação dos referidos dias e períodos horários no ano em curso; c) Haver compensação integral do respetivo período de trabalho” (…).  Por forma a justificar a inclusão desta norma, escreveu-se, a propósito desta disposição, no Projeto de Lei n.º 27/VII (disponível em http://www.parlamento.pt ), que veio a dar lugar à LRR, o seguinte: “O direito de suspender o trabalho no dia de descanso semanal, nos dias das festividades e nos períodos horários que lhes sejam prescritos pela confissão que professam (…) deve compatibilizar-se com os direitos da entidade empregadora e com o princípio da igualdade. Seguiu-se o modelo de alguns acordos italianos [artigo 17.º da Lei n. o 516, de 22 de novembro de 1988 (adventistas), artigo 4.º da Lei n.º 102, de março de 1989 (comunidades hebraicas)], aplicável em regime de flexibilidade de horário. É certo que o Estado francês concede aos seus funcionários e agentes autorização de ausência por ocasião das festas próprias das confissões ou comunidades arménia, israelita ou muçulmana a que pertençam, em três dias por ano em cada caso (circular de 9 de janeiro de 1991). Mas esta solução não resolve os problemas de igualdade referidos”. Ou seja, foi nítido propósito do legislador encontrar aquele necessário equilíbrio entre o direito de liber- dade religiosa e os legítimos direitos da entidade empregadora, não esquecendo, como não poderia deixar de ser, o princípio constitucional da igualdade.  Citando aqui a sentença (refira-se, por ser de elementar justiça, que a mesma se encontra doutamente ela- borada) “como decorre desta exposição de motivos, ao procurar salvaguardar e assegurar o direito de liberdade de consciência, de religião e de culto, a que se refere o artigo 1.º, articulando-o com o princípio da igualdade, este consagrado no artigo 2, o legislador procurou nesta matéria alcançar uma solução equilibrada, no sentido de conseguir compatibilizar os direitos potencialmente em conflito, ou seja, de um lado, os do trabalhador que professa determinada religião e pretende observar o “descanso semanal”, os “dias das festividades” e os “períodos horários que lhes sejam prescritos pela confissão que professam”; e, de outro lado, os da entidade empregadora, desde logo, ao livre exercício da iniciativa económica privada “nos quadros definidos pela Cons- tituição e pela lei e tendo em conta o interesse geral” [n.º 1 do artigo 61.º CRP], bem como de “Liberdade de (..) organização empresarial” [artigo 80.º alínea d) , da CRP], a que acrescem, como expressão daqueles, os poderes que a lei ordinária lhe confere, nessa qualidade de empregador, de “estabelecer os termos em que o trabalho deve ser prestado, dentro dos limites decorrentes do contrato e das normas que o regem” [art. 97.º do CT], e, para além de outros, os de “determinar o horário de trabalho do trabalhador, dentro dos limites da lei” [n.º 1 do artigo 212.º do CT]”.  Como corolário do seu poder de direção, ínsito à celebração do contrato de trabalho, cabe à entidade empregadora, dentro dos limites legais e da regulamentação coletiva em vigor, estabelecer o horário de traba- lho, como um dos instrumentos ao seu alcance com vista a uma correta organização técnico-produtiva. Obje- tivo este que só numa análise muito simplista pode ser encarado como sendo do interesse exclusivo da entidade empregadora: é que uma correta gestão terá como uma das facetas decisivas a manutenção do emprego dos seus trabalhadores e a otimização das suas condições de trabalho.

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