TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
609 acórdão n.º 544/14 cumulativos para o exercício de um direito fundamental constitucionalmente consagrado», considerando, do mesmo passo, inconstitucionais as suas alíneas, na interpretação que lhes foi dada pelos tribunais a quo, invocando o desrespeito pelos artigos 13.º, 18.º e 41.º da Constituição da República Portuguesa (CRP). Estabelece o artigo 14.º, n.º 1, da Lei da Liberdade Religiosa, o seguinte: «(…) Artigo 14.º Dispensa do trabalho, de aulas e de provas por motivo religioso 1 – Os funcionários e agentes do Estado e demais entidades públicas, bem como os trabalhadores em regime de contrato de trabalho, têm o direito de, a seu pedido, suspender o trabalho no dia de descanso semanal, nos dias das festividades e nos períodos horários que lhes sejam prescritos pela confissão que professam, nas seguintes condições: a) Trabalharem em regime de flexibilidade de horário; b) Serem membros de igreja ou comunidade religiosa inscrita que enviou no ano anterior ao membro do Governo competente em razão da matéria a indicação dos referidos dias e períodos horários no ano em curso; c) Haver compensação integral do respetivo período de trabalho.». 5.1. Para a delimitação da questão de constitucionalidade objeto do presente processo, cumpre ter em conta que, no requerimento de interposição de recurso, a recorrente sustenta a sua posição remetendo fre- quentemente para a suscitação das questões de constitucionalidade já feita perante o Tribunal que proferiu a decisão ora recorrida. Ora decorre do teor das suas alegações de recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa (a fls. 295-329) que a recorrente entende que «o artigo 14.º da Lei da Liberdade Religiosa, ao tentar regulamentar a dispensa de trabalho em dia de descanso semanal, nos dias de festividades e nos períodos horários que sejam prescritos pela religião (…) contém uma série de condições e requisitos cumulativos que não podem deixar de ser vistos como violadores da Lei Fundamental (…)» (fls. 314), considerando «inegável o perigo da indeterminação dos con- ceitos apresentados como requisitos de execução nestas três alíneas» e «notória a violação dos princípios cons- titucionais da igualdade e proporcionalidade que a precipitada interpretação dos mesmos permite» (fls. 317). A suscitação da questão de inconstitucionalidade das várias alíneas do n.º 1 do artigo 14.º da Lei da Liberdade Religiosa é reportada à sua interpretação, «na medida em que os requisitos previstos no artigo 14.º da LLR constituem restrições e condicionamentos para o exercício de um direito fundamental do cidadão, têm de ser interpretados de acordo com a CRP (…). Por isto mesmo, relativamente às alíneas a) e c) estas só podem ser interpretadas no sentido do funcio- nário prestar trabalho efetivo; de facto, a verdade é que a nossa lei laboral não fala em regime de flexibilidade de horário, senão aquando das disposições sobre a maternidade. Qualquer outra interpretação e conclusão (…) é inconstitucional por flagrantemente violar o princípio da igualdade entre trabalhadores religiosos praticantes, impondo a não aplicação, e penalizando, portanto, o direito à liberdade religiosa da maioria dos trabalhadores – que não trabalham em regime de flexibilidade de horário. Do mesmo modo, a compensação deste trabalho poder ter uma duração e/ou penosidade semelhantes, podendo mesmo traduzir-se numa soma pecuniária, é questão cuja aplicação não pode estar na dependência de um mero juízo da entidade empregadora, sob pena de esvaziamento completo da norma e da sua proteção e eficácia. Quanto à alínea b) , por falta de densificação, não se mostra possível qualquer interpretação que respeite a Constituição, por representar um limite em desrespeito pelo princípio da proporcionalidade, ao ser exces- siva, por o artigo 35.º da LLR já exigir uma comunicação a efetuar para o registo nacional de pessoas coletivas – o qual é público – não ser claro quanto ao membro do Governo competente (…) e por ser excessivo o envio de uma nova declaração que já foi enviada para o registo das pessoas coletivas religiosas.
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