TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
589 acórdão n.º 544/14 Vejamos: O direito à liberdade religiosa está expressamente consagrado no artigo 41.º da Constituição: “1. A liberdade de consciência, de religião e de culto é inviolável 2. Ninguém pode ser perseguido, privado de direitos ou isento de obrigações ou deveres cívicos por causa das suas convicções ou prática religiosa 3. Ninguém pode ser perguntado por qualquer autoridade acerca das suas convicções ou prática religiosa, salvo para recolha de dados estatísticos não individualmente identificáveis, nem ser prejudi- cado por se recusar a responder (…)”. Como muito bem se refere na sentença recorrida, sendo um preceito constitucional relativo a um direito fundamental, a sua interpretação e integração deve ser feita de harmonia com a Declaração Universal dos Direitos do Homem (n.º 2 do artigo 16.º da CRP). A Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 18 de dezembro de 1948, trata a questão relativa à liberdade religiosa no seu artigo 18.º, nos termos seguintes: “Toda a pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião; este direito implica a liberdade de mudar de religião ou de convicção, assim como a liberdade de manifestar a religião ou convicção, sozinho ou em comum, tanto em público como em privado, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pelos ritos”. A declaração da ONU de 25/11/1981, citada por Júlio Gomes, in Direito do Trabalho , vol. I, Relações Indi- viduais de Trabalho, p. 295, sobre a eliminação de todas as formas de discriminação e intolerância fundadas na religião e nas crenças, refere, no seu artigo 6.º, a liberdade de observar os dias de repouso e de celebrar as festas e cerimónias segundo os preceitos da própria religião ou culto. E não esquecendo, porque também aqui deverá ser o mesmo chamado à liça, o princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da CRP, segundo o qual “1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei. 2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual”. Assim, a todo o cidadão deverá ser reconhecida a faculdade de ter ou não ter religião, professar esta ou aquela, mudar de crença, praticá-la só ou acompanhado de outras pessoas, agrupar-se com outros crentes for- mando confissões ou associações de caráter religioso, etc. Nessa sua faculdade deverá estar ausente todo o tipo de coação, injustificada, exercida por qualquer pessoa ou autoridade pública. E se o culto pode ser meramente interno, quando se confina ao pensamento e à vontade de cada indivi- duo – e que tornará mais difícil, para não dizer impossível, a sua restrição de ordem externa, precisamente por dizer respeito ao for intimo do ser humano –, o que nos interessa para aqui será o culto externo, aquele que se manifesta externamente pelas formas mais variadas. Culto esse que poderá ser particular ou privado, quando celebrado pelos indivíduos, sós ou acompanhados, em nome próprio, ou público ou oficial, quando realizado em nome da comunidade e por ela, geralmente com a intervenção de ministro autorizado. Por esse artigo 41 º da CRP dizer respeito aos direitos, liberdades e garantias, ele é diretamente aplicável, vinculando as entidades públicas e privadas (n.º 1 do artigo 18.º da CRP), só podendo a sua restrição ser feita através de lei, limitada ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos, não podendo diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial daquele preceito (n. os 2 e 3 do mesmo artigo 18.º). Pese embora a consagração, logo em 1976, na nossa Constituição, só com a designada Lei da Liberdade Religiosa – Lei 16/2001 de 22 de junho – é que o legislador veio concretizar, em termos de lei ordinária, estes princípios de opção religiosa, bem como os critérios de organização e funcionamento.
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