TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

569 acórdão n.º 535/14 deputados não inscritos em grupo parlamentar ou aos deputados independentes na Assembleia da República e nas assembleias legislativas das regiões autónomas, ou por seu intermédio, para a atividade política e partidária em que participem”. Por sua vez, o n.º 4, do artigo 3.º, da Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro, decreta que aquela disposição tem natureza interpretativa. Em ambos os casos estamos perante normas legais sediadas num diploma legislativo não dotado de valor refor- çado, que regulam, por um lado, a competência do Tribunal Constitucional, e determinam, por outro, a natureza da norma de competência e o seu regime de aplicação no tempo. Ora, de acordo com o conjugadamente disposto nos artigos 166.º, n.º 2, e 164.º, alínea c) , da Constituição da República Portuguesa, os atos reguladores das matérias de organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional, designadamente quanto à competência, para além de se integrarem na reserva absoluta de compe- tência legislativa da Assembleia da República, devem, ainda, revestir a forma de lei orgânica. Acontece que, conforme resulta da mera consulta da Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro, esta não reveste a forma de lei orgânica dispondo, assim, sobre matéria que só por meio desta espécie de lei de valor reforçado pode ser regulada. Em face do exposto, as normas legais corporizadas no n.º 8, do artigo 5.º da Lei n.º 19/2003, de 20 de junho, na redação dada pelo artigo 1.º da Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro, ao regerem sobre matéria da competência do Tribunal Constitucional; bem como a norma contida no n.º 4, do artigo 3.º, da Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro, ao, indiretamente, dispor sobre a sua aplicação no tempo, violam a imposição constitucional resultante do disposto, conjugadamente, nos artigos 166.º, n.º 2; e 164.º, alínea c) , da Constituição da República Portuguesa, encontrando-se, assim, feridas de inconstitucionalidade formal. Para a eventualidade de, assim, se não entender, dir-se-á que a norma contida no n.º 8, do artigo 5.º da Lei n.º 19/2003, de 20 de junho, na redação dada pelo artigo 1.º da Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro, aplicável retroactivamente nos termos do disposto no n.º 4, do artigo 3.º, da Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro, na reda- ção atribuída pela Lei n.º 1/2013, de 3 de janeiro, não viola materialmente o plasmado no n.º 9, do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa, uma vez que esta norma constitucional respeita às garantias do processo criminal, matéria à qual é estranha a interpretação normativa cuja constitucionalidade é questionada. Todavia, tal interpretação normativa, ao ter sido configurada pelo legislador da Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro, como retroactivamente – ou no mínimo retrospectivamente – modificadora da competência para a fiscalização das contas dos grupos parlamentares/representações parlamentares, é suscetível de violar o princípio da segurança jurídica ínsito no princípio do Estado de direito democrático. Por fim, no que concerne à suposta violação do disposto no n.º 1 do artigo 214.º da Constituição da República Portuguesa, imputada à norma constante do n.º 8, do artigo 5.º da Lei n.º 19/2003, de 20 de junho, na redação que lhe foi dada pelo artigo 1.º, da Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro, não se nos afigura que ocorra qualquer lesão material da disposição constitucional invocada, uma vez que do texto do referido artigo 214.º não resulta, diretamente, a atribuição de competência ao Tribunal de Contas para fiscalizar todas as aplicações de dinheiros públicos – com exceção das aludidas nas alíneas a) e b) , do n.º 1, do artigo 214.º –, não constituindo a não atri- buição, em situações concretamente identificadas, dessa competência, por parte do legislador ordinário, qualquer violação de princípios ou regras constitucionais. Em face do exposto, deverão ser julgadas formalmente inconstitucionais as normas jurídicas contidas no artigo 5.º, n.º 8, da Lei n.º 19/2003, na redação que lhe foi dada pelo artigo 1.º da Lei n.º 55/2010 de 24/12; bem como a norma jurídica resultante da conjugação destas com a plasmada no n.º 4, do artigo 3.º, da Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro, na redação atribuída pela Lei n.º 1/2013, de 3 de janeiro, ou, caso assim se não entenda, julgar mate- rialmente inconstitucional a aplicação retroativa – ou, no mínimo, retrospetiva – da norma ínsita no artigo 5.º, n.º 8, da Lei n.º 19/2003, na redação que lhe foi dada pelo artigo 1.º da Lei n.º 55/2010 de 24/12, por violação do princípio da segurança jurídica ínsito no princípio constitucional do Estado de direito democrático, plasmado no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa, negando, em consequência, provimento ao presente recurso.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=