TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

550 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL sequência de instrução, seguido de despacho emitido ao abrigo do artigo 311.º do Código de Processo Penal, está vedado ao Tribunal Colectivo, na fase introdutória da audiência de julgamento, declarar extinto o procedimento criminal e, em consequência, determinar o arquivamento dos autos, por falta de relevância criminal dos factos imputados aos arguidos». Vale a pena recordar o cerne da fundamentação do assim decidido: «(…) o que se proíbe é que o juiz de julgamento, nessa fase, possa sequer efetuar uma tal avaliação, devendo apenas decidir pela condenação ou absolvição do réu, após realizada a produção de prova e alegações, e fixados os factos que se provaram na audiência de julgamento. Esta limitação dos poderes do juiz de julgamento tem como fundamento um reconhecimento da autoridade do caso julgado formal. Tendo já sido decidido pelo juiz de instrução criminal, por decisão transitada em julgado proferida nesse processo, que o arguido deve ser submetido a julgamento pelos factos constantes do despacho de pronúncia, entende-se que o juiz do julgamento não pode reponderar a relevância criminal dos factos imputados ao arguido, com a finalidade de emitir um segundo juízo sobre a necessidade de realização da audiência de julga- mento. A autoridade do caso julgado formal, que torna as decisões judiciais, transitadas em julgado, proferidas ao longo do processo, insuscetíveis de serem modificadas na mesma instância, tem como fundamento a disciplina da tramitação processual. Seria caótico e dificilmente atingiria os seus objetivos o processo cujas decisões interlocutó- rias não se fixassem com o seu trânsito, permitindo sempre uma reapreciação pelo mesmo tribunal, nomeadamente quando, pelos mais variados motivos, se verificasse uma alteração do juiz titular do processo». De acordo com a doutrina expendida neste aresto, a decisão instrutória forma caso julgado formal, limi- tando, nessa medida, os poderes do juiz de julgamento quanto à submissão do arguido a julgamento pelos factos (e crimes) descritos na pronúncia. De resto, só o reconhecimento da atribuição de autoridade de caso julgado formal às decisões proferidas pelo juiz de instrução permite compreender a ressalva introduzida no n.º 2 do artigo 310.º do CPP, pela revisão operada em 2007, ao passar a acautelar expressamente a possibilidade de o juiz de julgamento excluir provas proibidas, apesar da irrecorribilidade da decisão instrutória que pronunciou o arguido pelos factos constantes da acusação, mesmo na parte respeitante à decisão de nulidades e outras questões prévias ou inci- dentais (artigo 310.º, n.º 1, do CPP). Na verdade, aquele normativo mais não faz do que ressalvar do caso julgado formal da decisão instrutória a decisão do juiz de julgamento relativa à exclusão de provas proibidas. Se o caso julgado formal não se verificasse, não seria preciso consagrar expressamente esta exceção. Ora, se se reconhece a intangibilidade do caso julgado formado pela decisão do juiz de instrução que decide o objeto do julgamento a realizar por outro juiz, por maioria de razão, não poderá deixar de se reco- nhecer a vinculação no processo (caso julgado) das decisões proferidas pelo juiz de instrução cujo conteúdo se apresenta como, material e formalmente, autonomizado da decisão instrutória (cujo escopo se esgota na definição do objeto do futuro julgamento). Só o reconhecimento de autoridade de caso julgado formal às decisões do juiz de instrução cumpre o «“direito à instrução” da competência de uma entidade imparcial e independente titular do poder soberano de administração da justiça», direito também ele reconhecido na jurisprudência do Tribunal Constitucional (vide Acórdão n.º 527/03). Aliás, cumpre notar que a apreciação da competência material do Tribunal de Instrução Criminal onde teve lugar a instrução não faz parte do saneamento oficioso do processo, no momento previsto no artigo 311.º do CPP, já que a apreciação que então é pedida ao juiz (de julgamento) é que verifique se a acusação (ou pronúncia) proferida nos autos reúne todos os requisitos para abertura de uma nova fase do processo, em que terá lugar o julgamento. Os vícios que o juiz de julgamento é chamado a controlar são aqueles que impedem o prosseguimento dos autos (“nulidades e outras questões prévias ou incidentais que obstem à

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