TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
546 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Como se referiu no Acórdão n.º 51/10, a propósito da questão de saber se a Constituição exige que haja recurso da decisão instrutória que pronuncie o arguido pelos factos constantes da acusação pública, na parte em que essa decisão aprecie nulidades da fase de inquérito suscetíveis de afetar a validade das provas, «o que está em análise não é senão a extensão da garantia do duplo grau de apreciação em matéria penal perante o despacho de pronúncia. A tónica deve ser posta nas consequências da irrecorribilidade, no que ela significa de limitação dos direitos de defesa, e não na configuração jurídica adotada, no fundamento concretamente operante, para vedar o segundo grau de jurisdição. Com efeito, ao menos como o recorrente a apresenta – e, apesar de o Tribunal não estar limitado pelos termos da alegação (artigo 79.º-C da LTC) não se veem razões para alargar a indagação a outros hipotéticos fundamentos de inconstitucionalidade de que não há rasto argumentativo ou indícios de plausibilidade –, a questão de constitucionalidade é só uma e sempre a mesma: saber se Constituição exige que haja recurso da decisão instrutória que pronuncie o arguido pelos factos constantes da acusação pública, na parte em que essa decisão aprecie nulidades da fase de inquérito suscetíveis de afetar a validade das provas. E, de acordo com a referida jurisprudência, não exige (…). Materialmente, não pode dizer-se violada uma garantia constitucio- nal que não existe ou que não tem a extensão alegadamente sacrificada». Também neste caso, apesar de as normas em apreciação se reportarem à irrecorribilidade da decisão que conheceu das nulidades da decisão instrutória, e não das nulidades, ou questões prévias arguidas na instru- ção, designadamente as referentes ao inquérito, a solução não pode deixar de ser a mesma. 22. De resto, vem também de longe o entendimento do Tribunal no sentido de considerar acautelado o n.º 4 do artigo 32.º da Constituição quando a instrução foi presidida por um juiz, a quem coube também proferir a decisão instrutória (vide Acórdão n.º 474/94 que julgou não inconstitucional uma norma referente ao diferimento da subida do recurso da decisão que indefere diligências requeridas na instrução), sendo que a verificação de controlo judicial da acusação cumpre o princípio do acusatório (n.º 5 do artigo 32.º da Constituição) enquanto instrumento da garantia da separação de funções dentro do processo penal entre instrução, acusação e julgamento. Finalmente, da norma constante da segunda parte do n.º 5 do artigo 32.º da Constituição não resulta que tenha de haver sempre uma fase de instrução, gozando o legislador de grande liberdade na determinação dos atos instrutórios que tenham de ficar subordinados ao princípio do contraditório. Assim, a inadmissibi- lidade do(s) recurso(s) em causa também não fere o princípio do contraditório. D.2. Da irrecorribilidade da decisão do juiz de instrução que conhece da arguição de nulidade insanável decorrente da violação das regras de competência material do tribunal de instrução criminal 23. Resta, assim, apreciar a primeira norma objeto do recurso. Trata-se do artigo 310.º, n.º 1, do CPP, interpretado no sentido de que é irrecorrível a decisão do juiz de instrução, subsequente à decisão instrutória, que aprecie a nulidade insanável decorrente da violação das regras de competência material do tribunal de instrução criminal. Como já foi referido, apesar de o recorrente reportar a referida norma à interpretação conjugada dos artigos 310.º, n. os 1 a 3 (a contrario), 399.º, 401.º, n.º 1, alínea b) (a contrario) e 414.º, n.º 2, do CPP, consideramos que o tribunal recorrido ancorou a sua interpretação tão-só no artigo 310.º, n.º 1, do CPP. Na tese do recurso, esta norma restringe desnecessariamente os direitos de defesa e de recurso do arguido, bem como o princípio do juiz legal, em violação dos artigos 18.º, n. os 2 e 3, 20.º, n.º 5, e 32.º, n. os 1, 4 e 9, da Constituição. 24. Diferentemente das normas antes analisadas [as identificadas pelas alíneas b) e c) ], a norma aqui em presença não se reconduz à irrecorribilidade da decisão instrutória, não sendo, pois, diretamente trans- poníveis para a análise da sua conformidade constitucional, os fundamentos habitualmente aduzidos na
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