TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
544 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL relativamente a todo o seu conteúdo decisório (abrangendo, pois, não apenas pronúncia propriamente dita, como também o saneamento do processo, com a inerente apreciação de todas as questões prévias e inci- dentais relevantes). Nos presentes autos, são, todavia, outras, as normas cuja conformidade constitucional cumpre apreciar, respeitando estas à irrecorribilidade, já não da decisão instrutória, mas, no caso de duas das normas em apreciação [as normas formuladas em b) e c) ], da decisão do juiz de instrução que conhece da arguição de nulidades da decisão instrutória, respeitando, por sua vez, a primeira norma formulada [norma formulada em a) ], à irrecorribilidade da decisão que conhece da arguição da nulidade processual insanável decorrente da instrução ter sido realizada por um juiz de instrução criminal materialmente incompetente. 18. A assinalada diferença de objeto, não invalida, porém, que se chegue à mesma solução de conformi- dade constitucional que o Tribunal tem afirmado no que respeita à irrecorribilidade da decisão instrutória. Ponto é que os fundamentos que serviram para afirmar aquele juízo de não inconstitucionalidade sejam transponíveis para a apreciação das normas agora em presença. É o que inequivocamente se verifica no que respeita às duas últimas normas invocadas, justificando-se, pois, separar a análise da conformidade constitucional das normas formuladas em b) e c) , da análise da norma formulada em a) . Começaremos por aquelas. D.1. Da irrecorribilidade da decisão do juiz de instrução que conhece da arguição de nulidades da decisão instrutória 19. Importa começar esta análise por recordar, ainda que em termos necessariamente sumários, o regime definido para a instrução no processo penal, de forma a enquadrar as decisões em causa. Assim, a instrução consiste numa fase facultativa do processo penal, que se segue ao inquérito. Sendo facultativa, pode ter início a requerimento do arguido, relativamente a factos de que tenha sido acusado (trata-se da situação que interessa aos pressentes). Neste caso, o juiz de instrução é chamado a verificar os pressupostos jurídico-factuais da acusação deduzida no final da fase de inquérito, decidindo se a causa deve ser submetida a julgamento para apreciação do mérito da acusação. Se, no termo da instrução, o juiz de instrução entender que o processo está em condições de ser sub- metido a julgamento, profere despacho de pronúncia, no âmbito do qual delimita o objeto do julgamento a realizar. Na sequência deste despacho, o processo é remetido a um outro juiz que realizará o julgamento. Ora, nesse momento, «recebidos os autos no tribunal, o presidente pronuncia-se sobre as nulidades e outras questões prévias ou incidentais que obstem à apreciação do mérito da causa, de que possa desde logo conhe- cer» (artigo 311.º, n.º 1, CPP). Mesmo depois de marcado o julgamento, dentro dos atos introdutórios da audiência de julgamento, o artigo 338.º, n.º 1, do CPP, ainda permite que o tribunal conheça e decida «das nulidades e de quaisquer outras questões prévias ou incidentais suscetíveis de obstar à apreciação do mérito da causa acerca das quais não tenha ainda havido decisão e que possa desde logo apreciar». Este regime evidencia a natureza intrinsecamente provisória do juízo indiciário formulado no despacho de pronúncia, o qual se destina a definir o objeto do julgamento a realizar necessariamente pelo Tribunal de julgamento. Numa outra perspetiva, não deve, tão-pouco, perder-se de vista que a pronúncia desempenha uma função de garantia, visando impedir que o arguido seja submetido a julgamento sem que haja motivo sério para tanto, não significando, de modo algum, uma antecipação do juízo de condenação do arguido (Acórdão n.º 124/90). A instrução deve, portanto, ser vista como uma fase processual que visa obter uma decisão final juris- dicional, configurando uma situação diversa daquela a que se reporta a sentença penal, já que, nos casos em que traduza decisão judicial de pronúncia, esta se queda na emissão de um juízo necessariamente indiciário e por natureza provisório de conteúdo não condenatório.
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