TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
543 acórdão n.º 482/14 de admitir o seu exercício apenas numa fase ulterior do processado, em face da decisão que a esse propósito o juiz de julgamento venha a proferir, “de modo a não paralisar ou introduzir bloqueamentos relevantes no desenrolar de um processo (criminal) que visa assegurar a proteção de direitos fundamentais ofendidos com a prática do crime”, como sustentou o relator, em aplicação da citada jurisprudência constitucional. Por outro lado, e devendo o processo criminal assegurar todas as garantias de defesa do arguido (artigo 32.º, n.º 1, da Constituição), assumindo-se, assim, na perspetiva garantística da Lei Fundamental, como um instrumento de realização, não apenas dos direitos fundamentais da vítima, mas também dos direitos funda- mentais do arguido, entre os quais o consagrado no n.º 5 do artigo 29.º da CRP, é evidente que a questão a que deve ser dada resposta, no presente recurso, é apenas uma: se a norma constante do n.º 1 do artigo 310.º do CPP, mesmo aplicada ao caso dos autos, em que a questão prévia que se discute é da violação do ne bis in idem, ao impedir o recurso da decisão instrutória, no segmento que a aprecia, deixa carecido de proteção o direito fundamental do arguido de não ser condenado por um crime de que foi (ou pode vir a ser) absolvido ou de não ser sujeito a renovadas sanções penais pela prática de crime pelo qual já foi (ou virá a ser) punido. Ora, a resposta não pode deixar de ser negativa, atentas as razões consolidadamente afirmadas pelo Tribunal Constitucional, (…) pois que em fase posterior do processo criminal, a do julgamento, poderá sin- dicar perante uma instância de recurso a decisão proferida pelo juiz de julgamento sobre tal questão prévia, garantindo-se, assim, pela intervenção de duas instâncias jurisdicionais diferentes, a tutela judicial efetiva, em tempo útil, do direito que ora invoca em juízo (tal como sucede com todos os outros direitos que os arguidos invocam, a título de questão prévia, perante o juiz de instrução), sem prejudicar a celeridade do processo criminal em curso e a defesa dos direitos fundamentais que, também com assento constitucional, a reclamam». D. A irrecorribilidade de decisão do juiz de instrução posterior à decisão instrutória 16. A dimensão normativa ora em análise, em todas as normas a sindicar, não consiste, porém, na irre- corribilidade da decisão instrutória em si mesma considerada, antes na irrecorribilidade de decisão do juiz de instrução proferida já em momento posterior à prolação da decisão instrutória. Em duas das normas em apreciação [as formuladas em b) e c) supra referidas] está em causa a irrecorri- bilidade da decisão que conhece da arguição da nulidade da decisão instrutória, ou mais precisamente ainda, a irrecorribilidade da decisão do juiz de instrução, subsequente à decisão instrutória, que indefere a arguição de nulidade(s) daquela decisão. Por seu lado, a primeira norma [formulada em a) ] reporta-se à irrecorribilidade da decisão, também sub- sequente à decisão instrutória, que conhece da arguição de nulidade insanável decorrente da incompetência material do tribunal para a instrução do processo. 17. Entende o Ministério Público que o recorrente pretende apenas escamotear uma norma já julgada não inconstitucional, defendendo que a solução tem de ser a mesma, uma vez que «a questão jurídica cuja essência se pretende ocultar, se encontra tratada, abundantemente, pelo Tribunal Constitucional, em sen- tido oposto ao defendido, pelo arguido, no presente recurso. Em segundo lugar porque, rigorosamente, tal questão jurídica, no que tem de medular, já foi abordada e decidida no vertente processo, por via da Decisão Sumária n.º 264/13 e do subsequente Acórdão n.º 437/13, ambos do Tribunal Constitucional» (ponto 21 das contra-alegações, fls. 722). Cremos, no entanto, que não existe coincidência entre a dimensão normativa extraída do artigo 310.º, n.º 1, do CPP que ocupou o recurso em que foi proferida a decisão sumária e o acórdão acabados de identi- ficar e aquelas que ocupam o presente recurso, nos termos já acima identificados. De resto, a dimensão normativa ora em apreciação (em qualquer das três normas a sindicar) não pode ser confundida com as que têm sido analisadas na jurisprudência do Tribunal Constitucional. Com efeito, este Tribunal apenas se debruçou sobre a irrecorribilidade da decisão instrutória, qua tale , ainda que
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