TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
527 acórdão n.º 482/14 julgado, mas este deve ceder quando as circunstâncias concretas do caso em apreço imponham a prevalência da lei penal de conteúdo mais favorável.” 34.º – Anota-se ainda que, neste último Acórdão caso o Tribunal apenas aceitou a reversibilidade do caso jul- gado para salvaguarda do direito à liberdade do arguido, por compressão do direito à segurança jurídica inerente ao caso julgado, o que, porém mereceu ainda assim dois votos contrários ao sentido da jurisprudência acima citada, formulados pelos Exm. os Senhores Juízes Conselheiros Pamplona de Oliveira e Maria João Antunes, que entende- ram, em síntese, que a norma aí em causa violava a tutela constitucional do caso julgado de forma desproporcio- nal, pela seguinte forma: “Partindo do princípio que os artigos 29.º, n.º 4, parte final, e 282.º, n.º 3, parte final, da Constituição ressalvam apenas leis descriminalizadoras (e equiparadas) e aceitando a proteção constitucional de uma dimensão objetiva do caso julgado penal (artigos 2.º, 111.º, n.º 1, 205.º, n.º 2, e 282.º, n.º 3, primeira parte, da Constituição), entendo que a restrição ao princípio da salvaguarda do caso julgado penal decorrente da norma em apreciação não é necessária para dar cumprimento ao princípio jurídico-constitucional da necessidade da privação da liberdade (artigos 27.º, n.º 1, e 18.º, n.º 2, da Constituição). Face ao que se dispõe na parte final do n.º 4 do artigo 2.º do Código Penal e à previsão de incidentes de execução da pena de prisão (artigos 61.º e 62.º do Código Penal), na medida em que permitem um juízo atualizado sobre as exigências preventivas a satisfazer.” 35.º – E que o argumento “constitucionalizante” da norma utilizado pelo Tribunal recorrido é manifesta- mente violador da tutela constitucional do instituto do caso julgado resulta ainda à evidência do douto Ac. do TC n.º 520/2011, Processo n.º 422/11, da 2.ª Secção, em que foi Relator o Exm.º Senhor Conselheiro João Cura Mariano, onde se pode ler que: “A autoridade do caso julgado formal, que torna as decisões judiciais, transitadas em julgado, proferidas ao longo do processo, insuscetíveis de serem modificadas na mesma instância, tem como fundamento a disciplina da tramitação processual. Seria caótico e dificilmente atingiria os seus objetivos o processo cujas decisões inter- locutórias não se fixassem com o seu trânsito, permitindo sempre uma reapreciação pelo mesmo tribunal, nomeadamente quando, pelos mais variados motivos, se verificasse uma alteração do juiz titular do processo.” (itálico nosso) 36.º – Pelo exposto, o argumento (a favor da conformidade constitucional da norma aplicada) da ausência de formação de caso julgado pela decisão do JIC que aprecia a competência material do TCIC, baseia-se na violação do conceito pré constitucional de caso julgado, bem como dos artigos 210.º, n.º 1, segunda parte, 208.º, n.º 2 e 3 e 18.º, n.º 1, 2 e 3, todos da CRP, do princípio da tutela segurança jurídica [artigo 9.º, alínea b) , da CRP], do princípio da obrigatoriedade das sentenças judiciais para quaisquer autoridades (incluindo judiciais – artigo 205.º, n.º 2, da CRP), do princípio da competência e hierarquia dos tribunais, no segmento em que integra os Tribunais e Instrução Criminal e o de Julgamento nos Tribunais de 1.ª instância (artigos 209.º a 211.º, da CRP), e da tutela particular conferida pela Constituição ao caso julgado (artigos 2.º, 111.º, n.º 1, 205.º, n.º 2, e 282.º, n.º 3, pri- meira parte, da Constituição). B – Quanto à (in)constitucionalidade da segunda norma: 37.º – Os artigos 310.º, n. os 1 a 3 (a contrario sensu) , 399.º, 401.º, n.º 1, alínea b) (a contrario sensu) e 414.º, n.º 2, todos do CPP, interpretados no sentido de que é irrecorrível a decisão do Juiz de Instrução, subsequente à Decisão Instrutória, que aprecie a nulidade da mesma decorrente de omissão de pronúncia sobre questões suscita- das pelo arguido no seu RAI, por restrição desnecessária dos direitos de defesa, do direito à instrução, à efetividade do direito ao contraditório em instrução, e de recurso do arguido, em violação dos artigos 18.º, n. os 2 e 3, 20.º, n.º 5, e 32.º, n. os 1, 4, 5, e 9, todos da CRP. 38.º – A norma em causa nega ao arguido o direito ao recurso ordinário relativamente à decisão que indefere a arguição da nulidade decorrente da potencial omissão de pronúncia da decisão instrutória sobre questões suscitadas pelo arguido no seu RAI. 39.º – Conforme se decidiu no acima citado Acórdão do TC n.º 520/2011, Processo n.º 422/11, da 2.ª Secção, em que foi Relator o Exm.º Senhor Conselheiro João Cura Mariano: “A lei reconhece ao arguido o direito de, uma vez deduzida acusação contra si, requerer a abertura da instrução, fase processual facultativa e que visa a compro- vação, pelo juiz de instrução, da decisão de deduzir acusação em ordem a submeter ou não o arguido a julgamento
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