TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
521 acórdão n.º 482/14 Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional: I – Relatório 1. A. interpôs, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional [Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC)], o presente recurso do despacho do Vice-Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa (constante de fls. 576 e verso), proferido em reclamação deduzida ao abrigo do artigo 405.º do Código de Processo Penal (CPP), que confirmou o des- pacho de não admissão do recurso que o recorrente interpôs do despacho que apreciou as nulidades por si arguidas da decisão instrutória que o pronunciou pela prática de um crime de falsificação, previsto e punido pelo artigo 256.º, n.º 1, alínea a) , do Código Penal. 2. Para melhor compreensão da questão de constitucionalidade colocada, convém ter presente a seguinte sequência de atos processuais: a) O recorrente foi acusado pelo Ministério Púbico pela prática de um crime de falsificação, previsto e punido pelo artigo 256.º, n.º 1, alínea a) , do Código Penal; b) Requereu a abertura da instrução; c) Realizada a instrução, em 30 de novembro de 2012 foi proferida decisão instrutória, pronunciando o ora recorrente pela prática do crime de que vinha acusado; d) Inconformado, interpôs recurso da decisão instrutória, recurso que não foi admitido pelo tribunal a quo ; IX – De resto, só o reconhecimento de autoridade de caso julgado formal às decisões do juiz de instrução cumpre o «“direito à instrução” da competência de uma entidade imparcial e independente titular do poder soberano de administração da justiça». X – O conceito jurídico-constitucional, de direito ao recurso, garantido no artigo 32.º, n.º 1, da Consti- tuição, implica que a reapreciação desta questão, a existir, caiba necessariamente a um tribunal hie- rarquicamente superior, pelo que, aceitando-se que a decisão do juiz de instrução relativa à arguição de nulidade decorrente da invocação da incompetência material do tribunal produz caso julgado formal, o pressuposto, em que assentou a decisão recorrida, da revisibilidade pelo juiz de julgamento dessa decisão, não se verifica; o poder de conhecimento do juiz de julgamento encontra-se limitado pela resistência decorrente da autoridade de caso julgado (formal) resultante da prolação da decisão proferida pelo juiz de instrução anteriormente nos autos. XI – Afastada a revisibilidade pelo juiz de julgamento da decisão proferida pelo juiz de instrução que conhece da arguição da incompetência material do tribunal para proceder à instrução dos autos, negar em absoluto o direito a uma reapreciação da questão da incompetência material do Tribunal de Instrução Criminal significaria admitir a ausência de defesa, e com ela, ausência também de tutela efetiva do direito ao juiz legalmente predeterminado para realizar a instrução, em negação do núcleo essencial do princípio do juiz natural, constitucionalmente garantido. Não se mostra compatível com esta garantia a reunião, num mesmo juiz, do poder de proferir a primeira e última palavra na definição da sua própria competência (ou mais precisamente ainda, do tribunal onde exerce funções).
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