TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
520 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL III – Sendo embora três as normas a sindicar é possível identificar um segmento comum a todas elas, no que respeita à questão de constitucionalidade colocada: a irrecorribilidade de despachos proferidos pelo juiz de instrução em momento posterior à prolação da decisão instrutória que conheçam da arguição de nulidades suscetíveis de a invalidarem. IV – O Tribunal Constitucional, em jurisprudência constante, tem considerado constitucionalmente admissível, por não configurar uma restrição desproporcionada do direito ao recurso em processo penal, que o legislador, em benefício da celeridade processual, determine a irrecorribilidade do des- pacho que pronuncia o arguido pelos mesmos factos constantes da acusação, bem como a irrecorribi- lidade da decisão instrutória na parte em que decide questões prévias ou incidentais àquele despacho (de pronúncia). Pressuposto essencial deste entendimento foi sempre a consideração da subsistência da possibilidade de reapreciação da questão pelo tribunal de julgamento em decisão suscetível de rea- preciação por um tribunal superior, porquanto passível de recurso. V – Em coerência, não pode deixar de se entender que o mesmo raciocínio se aplicará à irrecorribilidade do despacho que decida a arguição de vícios ( v. g. , nulidades) que afetem especificamente a decisão instrutória, designadamente na parte em que decida a arguição de nulidade da decisão instrutória por omissão do dever de pronúncia ou por falta de concretização dos factos imputados ao arguido. VI – A norma referente à irrecorribilidade da decisão do juiz de instrução que conhece da arguição de nulidade insanável decorrente da violação das regras de competência material do tribunal de instrução criminal já não se reconduz, porém, à irrecorribilidade da decisão instrutória, não sendo, pois, dire- tamente transponíveis para a análise da sua conformidade constitucional, os fundamentos habitual- mente aduzidos na jurisprudência do Tribunal na apreciação da norma que não admite o recurso da decisão instrutória (ou da decisão que conhece a arguição da nulidade daquela decisão). VII – Na decisão recorrida vem pressuposta a ausência de formação de caso julgado formal quanto à invo- cação da violação de regras atributivas da competência material. Esta perspetiva merece, todavia, uma análise mais aprofundada, quer na vertente da natureza provisória atribuída à decisão do juiz de instrução que conhece da arguição de nulidade insanável decorrente de incompetência material do tri- bunal para realizar a instrução, quer na vertente da competência atribuída ao juiz de julgamento para rever a decisão por aquele proferida sobre a matéria, cumprindo resolver a questão de saber se, à luz dos princípios do Estado de direito democrático e da segurança jurídica, deve considerar-se que forma caso julgado no processo (caso julgado formal) a decisão do juiz de instrução que aprecie a arguição da incompetência material do tribunal de instrução para realizar aquela instrução e a nulidade dela decorrente. VIII– Admitindo-se a formação de caso julgado pela decisão de pronúncia do juiz de instrução, não poderá deixar de se aceitar que as decisões de conteúdo autónomo proferidas pelo mesmo juiz têm a poten- cialidade de formação do mesmo caso julgado, não sendo reapreciáveis pelo juiz de julgamento; com efeito, se se reconhece a intangibilidade do caso julgado formado pela decisão do juiz de instrução que decide o objeto do julgamento a realizar por outro juiz, por maioria de razão, não poderá deixar de se reconhecer a vinculação no processo (caso julgado) das decisões proferidas pelo juiz de instrução cujo conteúdo se apresenta como, material e formalmente, autonomizado da decisão instrutória (cujo escopo se esgota na definição do objeto do futuro julgamento).
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