TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

494 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Resta, por conseguinte, o problema enunciado na segunda questão de constitucionalidade. Mas, mesmo aqui, impõe-se a formulação de algumas considerações delimitadoras. Com efeito, o recorrente integra no objeto do recurso os aspetos relacionados com as datas em que foram proferidas as decisões de primeira e de segunda instância e as respetivas conexões com a vigência da redação conferida em 2013 ao artigo 400.º, n.º 1, alínea e) , do CPP. Embora tais elementos sejam verificáveis por consulta dos autos, não podem, contudo, ser integrados no objeto do recurso. Com efeito, e embora os mesmos relevem precisamente para efeitos do problema – já mencionado – da sucessão no tempo de regimes distintos em matéria de recursos, o certo é que a decisão recorrida não atribuiu qualquer relevo decisório ao regime vigente à data da prola- ção das decisões de 1.ª e 2.ª instância. Percebe-se que tal relevo é indiretamente aferido quando se aquilata da «natureza interpretativa» da redação de 2013. No entanto, fazer integrar esses elementos no objeto do recurso, sem os mesmos terem sido expressamente assumidos como decisivos, pela decisão recorrida, para efeitos de determinação do regime legal aplicável, teria como efeito uma pronúncia, deste Tribunal Constitu- cional, sobre tal matéria, a qual, face à natureza da fiscalização concreta – que se enxerta em sede de recurso – extravasa o respetivo objeto. 16. Assim, cumpre delimitar e precisar o objeto do recurso, tal como formulado pelo recorrente, nos seguintes termos: a interpretação normativa do artigo 400.º, n.º 1, alínea e) , do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro, segundo a qual, aquele artigo, com a redação dada por esta Lei, constitui norma interpretativa do mesmo artigo com a redação anterior – ou seja, a que lhe foi dada pela Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto – sendo, por isso, de aplicação imediata a estatuição da irrecorribilidade de acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações que apliquem pena de prisão não superior a cinco anos. Do mérito do recurso 17. A aplicabilidade imediata da modificação introduzida pela Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro, ao artigo 400.º, n.º 1, alínea e) , do CPP assentou exclusivamente na consideração de que tal diploma detém, nestas fronteiras, a natureza de modificação legislativa de caráter interpretativo. Assim, e como dispõe o artigo 13.º, n.º 1, do Código Civil, “a lei interpretativa integra-se na lei interpretada”. O recorrido sustenta que esta qualificação se integra no âmbito da competência para interpretar e aplicar o direito ordinário, a qual, como se sabe, é exclusiva dos tribunais comuns. Cumpre em todo o caso recordar que do ponto de vista jurídico-constitucional está em causa apenas a observância das exigências estritas do princípio da legalidade criminal. Como mencionado, pelo seu Acórdão n.º 324/13, o Plenário do Tribunal Constitucional, na sequência de recurso interposto com fundamento no artigo 79.º-D da LTC, julgou inconstitucional a interpretação normativa resultante da conjugação das normas da alínea c) do n.º 1 do artigo 432.º e da alínea e) do n.º 1 do artigo 400.º do Código de Processo Penal, na redação da Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto, segundo a qual é irrecorrível o acórdão proferido pelas relações, em recurso, que aplique pena privativa da liberdade inferior a cinco anos, quando o tribunal de primeira instância tenha aplicado pena não privativa da liberdade, por violação do princípio da legalidade em matéria criminal (artigos 29.º, n.º 1, e 32.º, n.º 1, da Constitui- ção). Entendeu o Tribunal que tal interpretação normativa «cria uma exceção à regra da recorribilidade das decisões proferidas em segunda instância além das previstas no n.º 1 do artigo 400.º do CPP, na redação de 2007. Coloca o intérprete no âmbito da analogia constitucionalmente proibida, sendo indiferente que a norma encontrada fora da moldura semântica do texto seja constitucionalmente admissível e político- -criminalmente defensável, uma vez que a liberdade dos cidadãos está acima das exigências do poder punitivo nas situações legalmente imprevistas.» Saliente-se, ainda, que o citado Acórdão n.º 324/13 é posterior à Lei n.º 20/2013, tendo-a tomado em consideração – sem, todavia, lhe atribuir natureza interpretativa (cfr. o ponto 2 da respetiva fundamentação).

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