TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

485 acórdão n.º 399/14 Na decisão sumária, para cuja fundamentação remete o acórdão recorrido, defende-se que estamos perante uma lei interpretativa, que se integra na lei interpretada, nos termos do artigo 13.º, n.º 1 do Código Civil. Porém, cremos que estamos perante uma clara alteração do pensamento legislativo e não perante uma mera lei interpretativa da versão anterior da alínea e) do n.º 1 do artigo 400.º do CPP. Em abono da tese defendida na referida decisão sumária – adotada pelo acórdão recorrido –, invoca-se a “Expo- sição de Motivos da Proposta de Lei n.º 77/XII, que está na origem daquela lei”. Contudo, não obstante considerarmos que do seu teor não se retira a conclusão defendida na decisão em aná- lise, há ainda que ter em conta que as circunstâncias em que uma lei é votada, os trabalhos preparatórios e a “Exposição de Motivos” são elementos indicativos, mas não decisivos, para se aferir do caráter interpretativo de uma lei, até, porque, normalmente, se tratam de questões de resolução singular. Aliás, por vezes, o legislador é tentado a designar, inclusive expressamente – o que não aconteceu no presente caso – como lei interpretativa certas leis que, na verdade, não o são, com a intenção de beneficiar do regime de aplicação da lei no tempo previsto no artigo 13.º do Código Civil. Nesses casos, têm entendido a Doutrina e a Jurisprudência que se deve considerar que aquela designação como lei interpretativa deve equivaler a uma atribuição expressa por parte do legislador de efeitos retroativos à lei em causa, devendo, enquanto tal, respeitar as limitações constitucionais que existem a este respeito. Ademais, mesmo tendo em conta a tese da alegada natureza interpretativa da lei em causa, defendida na decisão sumária e secundada pelo acórdão recorrido, chegar-se-ia à conclusão que tal interpretação chamada “autên- tica” – seria inconstitucional, pelos motivos supra e infra expostos. V. Deverá, assim, ser julgada inconstitucional, por violação do disposto nos artigos 20.º, 29.º, n.º 1 e 32.º, n.º 1, todos da Constituição da República Portuguesa, que consagram o princípio da legalidade em matéria criminal e o princípio das garantias de defesa, incluindo o recurso, a norma extraída das disposições conjugadas do artigo 13.º, n.º 1 do Código Civil e do artigo 400.º, n.º 1, alínea e) , do CPP, na redação introduzida pela Lei n.º 20/2013, de 21.02, na interpretação segundo a qual esta última norma é interpretativa da mesma norma com a redação introduzida pela Lei n.º 48/2007, de 29.08 e, como tal, é imediatamente aplicável aos acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas Relações, após a entrada em vigor da Lei n.º 20/2013, de 21.02, em processo-crime cuja decisão em 1.ª instância tenha sido proferida antes da entrada em vigor dessa lei e que não tenha sido confirmada pelo acórdão da Relação. Ainda assim, decidiu-se em sentido contrário na decisão sumária confirmada pelo acórdão recorrido, ado- tando-se, na nossa modesta opinião, uma interpretação das normas em causa ferida de inconstitucionalidade, nos moldes anteriormente expostos, motivo pelo qual se reclama a sua revogação. VI. Quanto a esta questão, importa ter presente a douta posição defendida pelo Prof. Cavaleiro de Ferreira que considera que as leis interpretativas são de aplicação aos factos pretéritos se forem mais favoráveis ao arguido, só nessa medida se integrando nas normas interpretadas. De igual modo, jamais seria aplicável a alegada norma interpretativa ao presente caso, porquanto, a mesma seria desfavorável para o recorrente. VII. Não obstante o já alegado, consideramos que, mesmo atendendo ao disposto no artigo 13.º, n.º 1 do Código Civil, em caso algum seria de aplicar, ao presente caso, a alegada norma interpretativa, porquanto, teria de ser salvaguardado o direito ao duplo grau de recurso, adquirido pelo recorrente aquando da prolação da decisão em 1.ª instância, situação essa salvaguardada na parte final da referida norma, referindo-se a “atos de natureza análoga”. VIII. Pelo exposto, deverá considerar-se ser aplicável aos presentes autos o disposto no artigo 400.º, n.º 1, alínea e) do CPP, na redação introduzida pela Lei n.º 48/2007, de 29.08, porquanto, era a versão em vigor em 16.04.2012, data em que foi proferida e depositada a decisão em 1.ª instância. IX. Para defesa da irrecorribilidade do douto acórdão proferido pelo Tribunal da Relação, na decisão sumária de que o recorrente reclamou – e, consequentemente, o acórdão recorrido que para ela remete – alegou-se, então, o decidido no acórdão de fixação de jurisprudência do STJ, de 9 de outubro de 2013, com o n.º 14/2013,

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