TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
464 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL favorecer alguns credores em detrimento dos outros” (José Alberto Vieira, ob. cit., p. 266). Por último, a alínea c) , assenta na verificação de dúvidas legítimas apostas pelos credores sobre a veracidade ou completude da relação de créditos apresentada pelo devedor, com consequências desfavoráveis quanto ao tratamento para aqueles previsto no plano de pagamento (Carvalho Fernandes e João Labareda, ob. cit., p. 828). 10. Resulta deste regime incidental que o interesse primacialmente atendido na concessão de supri- mento corresponde ao interesse do credor – agora nas vestes de credor oponente – contra tratamento que afeta negativa e irreversivelmente o seu direito subjetivo no processo de insolvência. Uma vez homologado o plano de pagamentos e encerrado o processo de insolvência, apenas as obrigações deles constantes podem ser exigidas, nos termos em que foram modificadas ou reduzidas (sobre este ponto, cfr. Luís Menezes Leitão, ob. cit. , p. 331). Intercedem, igualmente, considerações de celeridade e de eficácia do regime processual de insolvência, em termos constitucionalmente relevantes face ao disposto no artigo 20.º, n.º 5, da Constituição, uma vez que os processos de insolvência, incluindo todos os seus incidentes, apensos e recursos, apresentam natureza urgente (artigo 9.º do CIRE). Recorde-se que o incidente em que se inscreve a norma questionada é susce- tível de ser encerrado liminarmente, em função de juízo de manifesta evidência da sua inviabilidade (“situa- ções limite”, como aponta José Alberto Vieira, ob. cit. , p. 263), caso em que se encontra igualmente vedado o recurso do devedor (artigo 255.º, n.º 1, do CIRE). Denota-se, logo aí, a preocupação do legislador em acautelar a dilação indevida do incidente, tendo em atenção o efeito suspensivo do processo de insolvência que acarreta, o que encontra incidência acrescida num momento em que o juízo de inviabilidade quanto à aprovação já não é probabilístico; no momento regulado pelo artigo 258.º não se mostra necessária prognose sobre a reação de um credor normal, pois encontra-se adquirida a efetiva resposta negativa de credores ao plano de pagamentos, o que faz confere à normação impeditiva do recurso do devedor contida no seu n.º 4 a força do argumento de maioria de razão. Mostra-se, então, razoável e justificado, sem entorse ao princípio da igualdade na dimensão de igualdade de armas ou de posições no processo, decorrente do princípio do processo equitativo, que a legitimidade recursória seja conferida apenas ao sujeito que vê a sua vontade assim contrariada e sofre modificação ou restrição no seu direito de crédito. O interesse do devedor existe, é certo, na medida em que depende dessa decisão para mitigar as consequências pessoais e patrimoniais mas revela-se como interesse subordinado, não podendo ser colocado no mesmo plano da satisfação eficiente e eficaz dos direitos dos credores, objetivo precípuo do processo de insolvência. Permanecem aplicáveis, uma vez afastada a alternativa que constitui o processo simplificado de insolvência das pessoas singulares, as medidas de proteção do património do deve- dor conferidas no âmbito do regime comum de insolvência. Também assim se entendeu no Acórdão n.º 69/14, em termos transponíveis para os presentes autos: «Ora, do regime legal descrito decorre que a decisão judicial de suprimento da aprovação do plano de paga- mentos, e sua consequente homologação, coloca os credores oponentes numa posição processual particular que não encontra paralelo nem na posição dos demais credores, que deram o seu assentimento ao plano, nem na posi- ção do devedor que o propôs. Tão-pouco existe paralelo com a posição jurídico-processual que para o devedor deriva do indeferimento do pedido, por si apresentado, de suprimento da aprovação de alguns credores. É que neste caso, o processo de insol- vência segue os seus termos normais, gozando os devedores de todos os direitos previstos no CIRE, entre os quais se conta, designadamente, o direito de recorrer da decisão que vier a declarar a insolvência. Diferentemente dos credores, cuja oposição ao plano de pagamentos é suprida por decisão do juiz (e, nessa medida, veem o seu direito de crédito modelado ou restringido contra a sua vontade), o devedor, que não veja deferido o pedido de suprimento da vontade dos credores oponentes do plano, não sofre qualquer alteração na sua esfera de direitos com a decisão de indeferimento.
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