TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

454 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL A seu respeito, escrevia José Alberto Vieira: “Os credores podem aprovar o plano de pagamentos proposto pelo devedor ou rejeitá-lo. Nenhum critério normativo determina a posição a tomar por eles. Os credores são os juízes do seu interesse.” E adiante: “A aprovação do plano de pagamentos resulta da aceitação de todos os credores, independentemente do peso relativo de cada credor na situação patrimonial do devedor. E basta a rejeição de um só credor para pôr em crise a aprovação do plano de pagamentos. Sem unanimidade, o plano de pagamentos pode ser rejeitado.” É a vontade dos credores, estritamente, o que está em causa. Como nota o Professor José Alberto Vieira, sem exigência de orientação normativa, que não tem de ser critério de prossecução da sua conveniência. E é àquela – à vontade dos credores – que o tribunal se há de (se pode) substituir no quadro do artigo 258.º cód insolv; de alguma forma, superando o bloqueio da sua oposição quando para esta não encontre razão bastante, e como que fazendo aí acrescentar um fator de proteção ao interesse do devedor. É isto tudo que também permite situar o alcance do suprimento – carente dos maiores cuidados e cautelas, já que situado em quadro de superação de uma vontade privada, que não pode preterir o interesse primordial, presente sempre (de proteção dos credores); embora, ao mesmo tempo, dando guarida, em medida ajustada, a um interesse que também se crê dela merecedor, do devedor. O suprimento do tribunal representa um sucedâneo da aceitação dos credores oponentes ao plano apresentado pelo devedor; permitindo obter a aprovação que algum, ou alguns, rejeitem. E nele o que o tribunal deve principal- mente controlar “é que os credores recebam um tratamento igualitário no que toca à satisfação dos seus créditos, não obstante eventuais diferenças entre os seus créditos, e que o plano não constitua uma tentativa de favorecer alguns credores em detrimento dos outros”. A sua decisão positiva deve fundar-se em razões que levem a suspeitar, com alguma solidez, nenhum óbice sério, razoável, ou merecedor de aceitação, haver com virtualidade de permitir gerar prejuízo à satisfação igualitária dos interesses dos credores, que urge sempre salvaguardar; de alguma forma, não se perspetivar perturbação razoável à realização adequada dos fins substanciais que guiam primacialmente o processo de insolvência. Sendo esta injustificação, na rejeição do plano por algum dos credores, que viabiliza a sua superação; e, neste particular, no desequilíbrio da proteção (assumida pelo tribunal) agora em favor do devedor. Naturalmente, que os interesses substanciais latentes (sempre a proteção primacial dos credores) e o desequi- líbrio agora evidenciado por este segmento normativo (em beneficio do devedor) permitem, com facilidade, com- preender que se admita recurso, a interpor pelos credores, da decisão que supra a respetiva aprovação. Mas ao mesmo tempo tornam percetível a opção do legislador ordinário pela irrecorribilidade da decisão que a indefira. O primado é o da satisfação dos credores. Na ótica do devedor consagra-se este regime sucedâneo, simplificado, de processo de insolvência, já de si altamente vantajoso na prossecução do seu próprio interesse, que desvia das consequências e dos estigmas correntemente aliados à insolvência. O interesse do devedor não pode ofuscar o dos credores. Este, que prevalece, é ainda prosseguido pela garantia de um segundo grau de jurisdição. Já aquele, salvaguardado por um (único) grau de jurisdição, por este se basta; logo porque não merece a mesma dignidade do outro, a que se submete. A garantia da jurisdição está, em ambos os casos, salvaguardada; com a diferença de, num caso, o ser em duplo grau e, no outro, em grau único. E com as razões objetivas evidenciadas; portanto, sem arbitrariedade mas ao invés com sustentação plausível – que assim permite percecionar a diferença de tratamento e, dessa forma, conformar o princípio constitucional da igualdade (artigo 13.º, n.º 1, da Constituição da República).

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