TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
391 acórdão n.º 572/14 O abandono da lógica de equivalência entre cortes de pensões e cortes salariais (tanto na sua estrutura como na sua teleologia) torna clara a subordinação uniforme aos mesmos fins de todas as normas que inte- gram a CES: a garantia da sustentabilidade do sistema de pensões e a correção de desequilíbrios dentro do sistema. Ainda que reflexamente contribua também para o equilíbrio das contas públicas, o fim da norma ganha autonomia, afastando-se de uma lógica orçamental geral de equilíbrio das contas públicas e ganhando uma ligação específica ao sistema de pensões. Esta conclusão é confirmada pela inserção desta medida no contexto da aprovação pela Assembleia da República do decreto que cria uma “contribuição de sustentabi- lidade” em moldes semelhantes. As dificuldades sentidas no financiamento do sistema público de pensões não nasceram com a crise económica recente. Tendo origem também nas variações demográficas verificadas, elas constituem um problema autónomo que perdurará independentemente da situação atual de contração económica. Ora, a mudança na fundamentação da norma não se compadece com a mera replicação do juízo afir- mado sobre a norma que a antecedeu, antes exige uma reavaliação do juízo sobre a sua constitucionalidade. Para além da importância da letra do preceito e dos restantes elementos de interpretação, é o fim apresentado pelo autor da norma com expressão na sua concretização legal que deve constituir o ponto de partida na avaliação da sua conformidade, designadamente com o parâmetro constitucional da igualdade. A fórmula mais exigente de controlo do princípio da igualdade (igualdade ponderada), que tenho vindo a adotar em matéria de restrição de direitos fundamentais, preocupa-se com as diferenças existentes entre grupos de destinatários de normas e a sua correspondência com as diferenças dos regimes aplicáveis. Ora, o regime estabelecido com um fim (a garantia de sustentabilidade do sistema de Segurança Social) que é mais restrito do que o ano passado (redução do défice orçamental) reduz inevitavelmente os destinatários da medida aos titulares de pensões, impossibilitando o desenho de outros grupos de destinatários da norma e, por isso, inviabilizando qualquer comparação com as reduções salariais. Nesta conformidade deixa de ser convocável o parâmetro da igualdade para avaliar a validade constitucional destas normas. 5. Resta, assim, proceder à apreciação da sua conformidade constitucional à luz do princípio da proteção da confiança e da proporcionalidade, parâmetros convocados pelos requerentes na impugnação da validade desta medida. O meu ponto de partida na aplicação destes princípios à norma, hoje como sempre, é consi- derá-la uma restrição de um direito fundamental, por o quantum da pensão se dever considerar integrado na esfera de proteção do direito à segurança social. Ora, no que respeita à proteção da confiança, as considerações tecidas na declaração de voto que subs- crevi no Acórdão n.º 862/13 (relativo à designada “convergência de pensões”), conduziram-me agora, de novo, a um juízo de não violação daquele princípio, por prevalência do interesse público traduzido na garan- tia da sustentabilidade financeira do sistema de pensões e a proteção da justiça intergeracional e intragera- cional num sistema público de pensões assente numa ideia de solidariedade e igualdade social que conforma a afetação dos recursos. Como então ficou referido, «Determinante afigura-se, o imperativo de garantir a sustentabilidade e solvabilidade do sistema de segurança social (relacionado com a capacidade do Estado o financiar, de forma sustentada) e que é condição da sua subsistência. Quando a medida legislativa é ditada por razões funda- mentadas de imperioso e premente interesse público, o interesse individual na manutenção do regime legal não pode deixar de ceder diante do interesse do Estado em alterá-lo. O legislador tem de corresponder à sua incumbência constitucional de garante da sustentabilidade do sistema (artigo 63.º, n.º 2, da Constituição), introduzindo as alterações legislativas necessárias e adequadas para o efeito, numa aplicação equitativa da distribuição dos recursos disponíveis». Finalmente, foram ainda as considerações tecidas na mesma declaração de voto a propósito do princípio da proporcionalidade que me conduziram neste caso, a um juízo de não invalidade da medida, afigurando- -se-me que o limiar mínimo de aplicação da CES – € 1000 – complementado pela cláusula de salvaguarda que impede a redução da prestação mensal ilíquida da pensão a montante inferior àquele valor, apesar de
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