TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
388 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Tal não significa, contudo, que expectativas tidas como legítimas passem automaticamente a ilegítimas em virtude da mera repetição das medidas legislativas que romperam com a base da confiança anterior. Continua válida, por isso, a importância conferida ao “investimento” na confiança dos titulares de pensões complementares, mormente a conclusão de que estes teriam tomado outras opções se não fosse a confiança legislativamente gerada na não afetação do regime jurídico do vulgarmente apelidado “segundo pilar”. Avultam, ainda assim, razões para inverter o sentido da ponderação acima assinalada. Em consonância com a jurisprudência constitucional emitida na vigência do Programa de Assistência Económico-Financeira a propósito de medidas conjunturalmente justificadas pela necessidade de redução do deficit orçamental (cfr., particularmente, os Acórdãos n. os 399/10, 187/13 e 413/14, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt ) não há como fugir ao facto de que o contexto de forte dinâmica evolutiva, mormente em matéria de pensões, influencia aspetos ligados à imprevisibilidade das medidas ou à eventual necessidade de um regime transitório, suscetível de obstar ao caráter abrupto daquelas. Consideramos, por- tanto, que o artigo 78.º da LOE 2013, ao fazer soar o “aviso” de alterações futuras – visto que a contribuição extraordinária de solidariedade, porque conectada com o esforço de consolidação orçamental e com o agra- vamento da insustentabilidade do sistema de segurança social, tenderia a repetir-se anualmente – atenuou a imprevisibilidade ínsita à medida. Surge, assim, inelutavelmente mitigada a gravidade do “prejuízo” sofrido pelos cidadãos em causa, já que este será tanto mais destrutivo quanto maior a “surpresa” gerada pela norma- ção de rutura introduzida pelo legislador. Este elemento aproxima os titulares de pensões complementares dos demais pensionistas, deixando aqueles de justificar, nessa medida, uma proteção diferenciada ou refor- çada no confronto com o interesse público em que radicou a renovação da CES. Goradas as objeções a este nível, e não vislumbrando quaisquer outros dados aptos a obstaculizar a vali- dade constitucional da medida, mormente no que toca à redefinição do seu âmbito de aplicação, votámos no sentido da não inconstitucionalidade do artigo 76.º da LOE 2014. – José da Cunha Barbosa. DECLARAÇÃO DE VOTO 1. Votei a decisão de não inconstitucionalidade das normas constantes do artigo 76.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 13/2014, de 14 de março, rela- tivas à Contribuição Extraordinária de Solidariedade (CES), apreciadas no Acórdão, mas não acompanho totalmente a sua fundamentação. A minha discordância da fundamentação do Acórdão diz respeito, essencialmente, à qualificação da norma impugnada como “transitória” e desligada da aprovação pela Assembleia da República do decreto que cria uma “contribuição de sustentabilidade”, fazendo-se apelo à decisão tomada relativamente à CES no Acórdão n.º 187/13 (relativo à lei que aprova o Orçamento do Estado para 2013). Em meu entender, a norma em apreciação deve ser vista no contexto da “contribuição de sustentabilidade” já aprovada e da fun- damentação da CES que é dada, hoje, pelo Governo e aceite pela Assembleia da República – que é distinta da apresentada no ano passado. No respeito pelo princípio da separação de poderes, o ponto de partida do escrutínio da conformidade da norma com o parâmetro constitucional deve ser a fundamentação dada pelo legislador para a medida, concretizada na norma em causa. 2. Assim, afasto-me desde logo do ponto de partida da fundamentação adotado no Acórdão que traduz a “configuração” e “efeitos” das normas impugnadas. Depois de aludir às razões enunciadas pelo Governo na exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 193/XII e aos seus antecedentes legislativos, o Acórdão conclui que a nova configuração da CES não tem o alcance de obstar à sua classificação como medida extraordinária e transitória. Reconhecendo embora que
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