TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
371 acórdão n.º 572/14 poderes públicos; ii) que tais expectativas sejam legítimas, fundadas em boas razões, a avaliar no quadro axio- lógico jurídico-constitucional; iii) por último, que o cidadão tenha orientado a sua vida e feito opções decisi- vas, precisamente, com base em expectativas de manutenção de um determinado regime jurídico (Acórdãos n. os 287/90 e 128/09). Verificados estes requisitos ou “testes, deverá igualmente ter-se em conta o indispensável contrapólo valorativo, que no caso sub judice é constituído pela relevância do interesse público que fundamentou a ins- tituição da CES: a necessidade de equilíbrio orçamental e de diminuição do défice público num espaço de tempo relativamente curto. Esta ponderação, a levar a cabo de acordo com os critérios do princípio da proi- bição do excesso, permitirá avaliar da eventual razoabilidade ou justificação da lesão da confiança invocada. Como se afirma no Acórdão n.º 862/13, a aplicação do princípio da confiança «implica sempre uma ponderação de interesses contrapostos: de um lado, as expectativas dos particulares na continuidade do quadro legislativo vigente; do outro, as razões de interesse público que justificam a não continuidade das soluções legislativas. Os particulares têm interesse na estabilidade da ordem jurídica e das situações jurídicas constituídas, a fim de organizarem os seus planos de vida e de evitar o mais possível a frustração das suas expectativas fundadas; mas a esse interesse contrapõe-se o interesse público na transformação da ordem jurí- dica e na sua adaptação às novas ideias de ordenação social. Como os dois grupos de interesses e valores são reconhecidos na Constituição em condições de igualdade, impõe-se em relação a eles o necessário exercício de confronto e ponderação para concluir, com base no peso variável de cada um, qual o que deve prevalecer. O método do juízo de avaliação e ponderação dos interesses relacionados com a proteção da confiança é igual ao que se segue quando se julga sobre a proporcionalidade ou adequação substancial de uma medida restritiva de direitos. Mesmo que se conclua pela premência do interesse público na mudança e adaptação do quadro legislativo vigente, ainda assim é necessário aferir, à luz de parâmetros materiais e axiológicos, se a medida do sacrifício é «inadmissível, arbitrária e demasiado onerosa». 14. No caso em apreço, observe-se que a reconfiguração da CES levada a efeito pelo artigo 2.º da Lei n.º 13/2014, de 14 de março, atingiu pensionistas que já estavam abrangidos por essa contribuição e pensio- nistas que a ela nunca foram sujeitos. Com efeito, enquanto a alteração ocorrida nas alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 76.º da LOE de 2014 afetou pensionistas já cobertos pela CES – os que têm pensões superiores a € 3750 – e cuja taxa efetiva foi aumentada, a alteração constante da alínea a) do n.º 1 do mesmo preceito alargou o âmbito subjetivo da CES, passando a atingir também os pensionistas titulares de pensões superio- res a € 1000. Naturalmente que as expectativas dos pensionistas a quem é liquidado e cobrado o tributo têm uma dimensão diferente das expectativas daqueles a quem o mesmo nunca foi exigido. A situação de confiança na continuidade do regime legal é diferente, pois, estando a CES ligada a um elemento temporal – um ano económico –, a confiança depositada por quem já está temporariamente abrangido só pode ser que a mesma não venha a ser renovada no ano seguinte; já quem nunca foi afetado, não deixa de ver frustrada a expectativa de que o rendimento da sua pensão não seria atingido pela contribuição. Ora, para os pensionistas incluídos na base de incidência subjetiva da CES desde 2013 – aqueles que agora vêem agravada a taxa efetiva, por serem titulares de pensões de valor superiores a € 3750 – pode defender-se que não existem verdadeiras expectativas de não reposição da CES para o ano em curso, nem que se tenha gerado uma situação de confiança tutelável de que tal regime não seria alterado, in pejus , quanto às taxas aplicáveis. Na verdade, situando-se ainda, pelo menos parcialmente, dentro do período de vigência do PAEF e integralmente dentro do período de observância de metas de redução do défice orçamental por este programa fixadas, é lícito sustentar que a decisão de renovar ou alterar a CES, não constitui um facto impre- visível ou, pelo menos, contrário às expectativas legítimas e razoáveis que o Estado tenha criado nos cidadãos. Já a situação de confiança de quem foi pela primeira vez afetado pela CES – os abrangidos pela alínea a) do n.º 1 do artigo 76.º – pode ser de maior consistência, uma vez que a exclusão do âmbito subjetivo do tributo, na configuração que a medida teve nas leis orçamentais anteriores, parece induzir uma condição de
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=