TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
369 acórdão n.º 572/14 Podemos, assim concluir que é lícito ao Tribunal Constitucional, na sequência da sua anterior jurispru- dência, entender que o artigo 76.º da Lei n.º 83-C/2013, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 13/2014, institui ainda uma medida de natureza transitória ou temporária, fator que deverá ser levado em conta na ponderação subjacente ao juízo de constitucionalidade. 2. Violação do princípio da proteção da confiança 11. Ambos os requerentes impugnaram a validade das normas do artigo 76.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 13/2014, de 14 de março, convocando como parâmetro constitucional o princípio da proteção da confiança, decorrente do princípio do Estado de direito contemplado no artigo 2.º da CRP. No essencial, alegam que as normas impugnadas reeditam um tributo parafiscal que tem como resultado prático a ablação de uma parcela significativa dos rendimentos de pensões, o que equivale ao não cumpri- mento dos compromissos estabelecidos pelo Estado, no quadro do sistema de proteção social, constitucional- mente previsto e protegido no artigo 63.º, n.º 2, da Lei Fundamental. Uma situação que prolonga no tempo a redução de parte dos rendimentos de uma categoria de cidadãos que se encontra em situação de especial fragilidade, face à impossibilidade de redefinição dos planos de vida e à grande dificuldade em encontrar fontes alternativas de rendimento. E que o simples facto de se prolongar, pelo segundo ano seguido, uma medida desta dimensão e gravi- dade representa uma lesão das legítimas expectativas dos particulares na continuidade do quadro normativo, no âmbito dos regimes de pensões. Estas expectativas não podem deixar de ser consideradas como particu- larmente intensas, na medida em que se alicerçaram com o decurso do tempo e com a sucessiva entrega de contribuições, apoiando-se em atividades e atitudes incentivadoras do próprio Estado, através do cumpri- mento, pelos particulares, da obrigação contributiva. 12. É evidente que os pensionistas são titulares de posições jurídicas subjetivas individuais que resultam diretamente da lei, em termos de poderem exigir do Estado a prestação que lhes é devida. O reconhecimento dessa posição, com um conteúdo preciso e definido, deposita nos pensionistas a “confiança” na estabilidade, continuidade e regularidade dessa posição, nos exatos termos em que a mesma foi constituída. Assim, e desde logo, o Tribunal admite que «os pensionistas são titulares de uma posição jurídica especialmente tutelada, no que respeita, em particular, ao princípio da proteção da confiança (…) Chegado o momento em que cessou a vida ativa e se tornou exigível o direito às prestações, o pensionista já não dispõe de mecanismos de autotutela e de adaptação da sua própria conduta às novas circunstâncias, o que gera uma situação de confiança refor- çada na estabilidade da ordem jurídica e na manutenção das regras que, a seu tempo, serviram para definir o conteúdo do direito à pensão» (Acórdão n.º 187/13). No entanto, apesar do direito à pensão, enquanto direito adquirido, ter maior proteção relativamente a modificações legislativas posteriores, o que está confirmado nos artigos 20.º e 66.º da Lei de Bases gerais do sistema de segurança social (cfr. Lei n.º 4/2007, de 16 de janeiro), a necessidade de salvaguardar direitos ou interesses constitucionalmente protegidos que devam considerar-se prevalecentes pode legitimar afetações dos direitos e expectativas legitimamente fundadas dos pensionistas. De facto, mesmo que se verifiquem os demais requisitos concretizadores do princípio da proteção da confiança, razões de interesse público podem justificar, em ponderação, a não continuidade do comportamento que gerou a situação de expectativas. Ora, no que respeita à CES, essa ponderação já foi feita pelo Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 187/13, que confrontou o regime jurídico da CES, previsto no artigo 78.º da LOE de 2013 – Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro –, com o princípio da confiança, concluindo pela inexistência de incons- titucionalidade. Depois de verificar a evolução do regime previdencial da segurança social e de ter concluído que «a evolução de política legislativa aponta já para uma gradual adaptação do quadro legal das pensões aos novos
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