TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

360 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 21. Assim, traduzir-se-á num sacrifício especialmente intenso, que ultrapassa em larga medida os limites da proporcionalidade, mostrando-se desrazoável e excessivo no quadro dos sujeitos afetados, que são precisamente aqueles que convocam os valores da solidariedade e da proteção social. 22. Quanto à aplicabilidade do princípio da proteção da confiança, este princípio ainda que não expressamente referido na Constituição da República Portuguesa, corresponde a um princípio essencial na Constituição material do Estado de direito, retirando-se do artigo 2.º da Constituição e consubstanciando-se na ideia de estabilidade e segurança jurídica. 23. De acordo com o Acórdão n.º 128/09, do Tribunal Constitucional: “Para que haja lugar à tutela jurídico-constitucional da «confiança» é necessário, em primeiro lugar, que o Estado (mormente o legislador) tenha encetado comportamentos capazes de gerar nos privados «expecta- tivas» de continuidade; depois, devem tais expectativas ser legítimas, justificadas e fundadas em boas razões; em terceiro lugar, devem os privados ter feito planos de vida tendo em conta a perspetiva de continuidade do «comportamento» estadual; por último, é ainda necessário que não ocorram razões de interesse público que justifiquem, em ponderação, a não continuidade do comportamento que gerou a situação de expectativa. Este princípio postula, pois, uma ideia de proteção da confiança dos cidadãos e da comunidade na estabili- dade da ordem jurídica e na constância da atuação do Estado. Todavia, a confiança, aqui, não é uma confiança qualquer: se ela não reunir os quatro requisitos que acima ficaram formulados a Constituição não lhe atribui proteção.” 24. As expectativas dos particulares na continuidade do quadro normativo, no âmbito dos regimes de pensões, são especialmente intensas, na medida em que são expectativas que se alicerçaram com o decurso do tempo e com a sucessiva entrega de contribuições, apoiando-se em atividades e atitudes incentivadoras do próprio Estado, atra- vés do cumprimento, pelos particulares, da obrigação contributiva. Ainda que o Tribunal Constitucional já tenha afirmado que o direito à pensão não significa o direito a determinado montante de pensão, há que ter em conta que o pensionista efetua descontos percentuais legalmente determinados sobre os seus rendimentos do trabalho, para que adiante, possa usufruir duma pensão que pretende refletir as remunerações que auferia quando no ativo e substituir os rendimentos do trabalho. 25. A partir do momento em que o sujeito se torna titular do direito à pensão, este entra na sua esfera jurídica “com a natureza de um verdadeiro direito subjetivo, um «direito adquirido» que pode ser exigido nos termos exatos em que foi reconhecido”. 26. Os sujeitos a quem se dirige a presente norma fizeram, efetivamente, planos de vida com base na expecta- tiva de continuidade do quadro normativo, mesmo que esses planos de vida, em concreto, apenas se traduzissem na sobrevivência e na manutenção de uma existência condigna. 27. Quanto ao interesse público subjacente à emissão da norma, este corresponde, aproximadamente, ao arre- cadar de cerca de 174 milhões de euros, como forma de, através da repercussão sobre a mesma categoria de sujeitos (reformados, aposentados e pensionistas) da necessidade de ultrapassar os efeitos da declaração de inconstituciona- lidade proferida pelo Acórdão n.º 862/13 do Tribunal Constitucional. 28. Ainda que se possa considerar a relevância do interesse público subjacente à diminuição do défice, este não poderá ser feito à custa das condições de sobrevivência e dignidade dos pensionistas, nem do atropelar da confiança que estes foram depositando na atuação do Estado. 29. Acresce a este argumento o facto de, no ano fiscal de 2013, o Governo ter omitido das contas públicas 1.045 milhões de euros, não tendo revelado a totalidade do montante atribuído às SGPS (Sociedades Gestores Participações Sociais) a título de benefícios fiscais, o que comprova que uma ligeira redução dos benefícios fiscais atribuídos em sede de IRC seria suficiente para que o Estado obtivesse a mesma receita esperada pelo agravamento da CES, sendo assim demonstrado que esta violação dos direitos dos pensionistas é desnecessária e, portanto, inconstitucional.»

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