TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

354 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 10. Analisado o regime instituído pelas normas cuja fiscalização se requer, bem como a fundamentação para o alargamento do seu âmbito, como veremos, constata-se que não teve o legislador como fundamentar adequa- damente e, de forma a obviar a uma violação do princípio constitucional da proteção da confiança, o regime que pretende implementar. 11. Por seu turno, a configuração da medida é ainda reveladora de uma violação do princípio constitucional da proibição do excesso, como se demonstra seguidamente, a vários níveis. 12. Em primeiro lugar, atento o contexto em que o próprio autor da iniciativa legislativa reconhece o caráter substitutivo da medida com vista à realização do programa orçamental a que se propõe, atenta a pronúncia pela inconstitucionalidade das medidas desenhadas inicialmente para determinar a convergência dos sistemas de pen- sões, não se pode deixar de identificar uma contradição insanável na sua argumentação justificativa da medida quanto à adequação da mesma: partindo-se de uma linha de raciocínio que continua a identificar o problema como sendo estrutural, o legislador continua a oferecer uma resposta meramente episódica, distinta da solução exigida nos termos do Memorando de Entendimento ao qual visa dar cumprimento, e distinta também da metodo- logia identificada pelo próprio Tribunal Constitucional como capaz de assegurar a adequação de qualquer medida a implementar, e que tem de passar pela construção de um sistema marcado pela “sustentabilidade e equidade interna, que permita conferir sentido aos sacrifícios impostos aos respetivos beneficiários, desse modo justificando- -os e legitimando-os à luz do princípio da tutela da confiança” (Acórdão n.º 862/13). 13. Sublinhe-se ainda que a fundamentação apresentada pelo Governo na exposição de motivos do diploma não se mostra capaz de revelar uma indispensabilidade de uma intervenção com a dimensão ablativa e gravemente penalizadora dos rendimentos de uma categoria de cidadãos mais desprotegidos que a medida em análise apre- senta: haveria, pois, que assegurar a demonstração efetiva da ausência de um quadro de alternativas de política orçamental que não penalizassem reiteradamente os mesmos rendimentos e nesta nova escala, agora agravada ou, mesmo, alternativamente, a sustentação da impossibilidade de conformação distinta da forma de execução do Programa de Assistência Económica e Financeira assinado entre as três instituições externas (Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional) e a República Portuguesa, na linha das sucessivas revisões e adaptações à realidade económica e constitucional que tiveram lugar no decurso da execução do Memo- rando de Entendimento. 14. Por seu turno, e não obstante o caráter progressivo das taxas a aplicar, o alargamento da contribuição a rendimentos superiores a € 1000, passando a afetar de forma inovadora um conjunto significativo de rendimentos até aqui excluídos da referida contribuição (cujo limiar inferior se estabelecia nos € 1350 na versão em vigor da referida medida), de forma especialmente penalizadora para uma categoria de cidadãos que, na esmagadora maioria dos casos, atenta a fase da sua vida e carreira contributiva, não podem adequadamente compensar ou programar meios de obtenção de rendimentos que lhes permitam assegurar um limiar de existência condigno. 15. Recorde-se a este respeito, uma vez mais, que a doutrina vertida no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 187/13 assentou a sua análise e a sua conclusão quanto à não inconstitucionalidade do diploma na presença de uma medida que apresentava um limiar de € 1350 como patamar inicial de incidência, concluindo nesse con- texto que as novas contribuições “não se revelam excessivamente diferenciadores, face às razões que se admitiram como justificativas da imposição desta medida penalizadora dos pensionistas, sendo as percentagens relativas ao montante das pensões […], similares às das reduções das remunerações de quem aufere por verbas públicas”, o que manifestamente não se verifica com a nova medida. 16. Paralelamente, cumpre igualmente ter em conta que, se é certo que o Tribunal Constitucional considerou encontrar-se a CES constante do Orçamento do Estado para 2013 ainda dentro dos limites do sacrifício exigível, tal sucedeu apenas na medida em que “dela se excluíram todos aqueles que auferem pensões inferiores a € 1350”, o que mais uma vez não ocorre com a norma em análise, impondo-se uma conclusão distinta quanto à desproporção do sacrifício exigido aos pensionistas.

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